O signo é a luz do ser refletida na linguagem




1. Sonhos e a Temporalidade da Mente

Um sonho esquecido por uma década pode retornar com força total quando algo no presente — um cheiro, uma luz específica, uma combinação de sons, uma arquitetura — reproduz com exatidão ou com densidade simbólica o mesmo contexto onírico. Isso se dá porque:

  • A mente não armazena memórias como um arquivo digital, mas como mapas relacionais de significados;
  • O sonho, especialmente os marcantes, é um texto semiótico: composto de signos, afetos, símbolos arquetípicos e intensidades.

Esse retorno pode parecer profético, ou mesmo sobrenatural, mas muitas vezes está enraizado em estruturas inconscientes que organizam o mundo por analogias e repetições.


2. Semiótica do Momento Presente como Gatilho

Sob a ótica da semiótica (Peirce, Barthes, Eco), o que ocorre é o seguinte:

  • Um ícone (algo visual ou sensorial semelhante ao sonho) ou um índice (um sinal que aponta para uma causa escondida) aparece no tempo presente;
  • Este signo evoca uma cadeia associativa que reconstrói o sonho antigo;
  • A memória do sonho se reativa não como uma lembrança passiva, mas como um reenquadramento ativo do real — como se o mundo de fora entrasse no mesmo palco de um mundo de dentro.

É como se o signo do presente completasse ou fechasse o ciclo de sentido iniciado no sonho.


3. Fenômeno do Déjà Rêvé

Diferente do déjà vu (já visto), o déjà rêvé é quando alguém tem a sensação forte e definida de que “isso eu sonhei” — e muitas vezes anos antes.

Esse fenômeno já foi estudado por neurologistas e psicólogos. Algumas hipóteses:

  • circuitos límbicos e hipocampais que armazenam traços de sonhos mesmo sem recordação consciente;
  • Quando o momento atual contém uma estrutura simbólica e afetiva semelhante ao sonho antigo, esses circuitos se reativam;
  • O cérebro então tenta costurar a realidade presente com a memória onírica esquecida, criando a sensação de que aquilo foi sonhado com precisão.

Conexões Filosóficas e Poéticas

Há um quê de eterno retorno nietzschiano, de tempo circular e de inconsciente estruturado como linguagem (Lacan). Você não apenas lembra do sonho: você o reconhece como se tivesse vivido dentro de uma narrativa que antecipa o agora, e que talvez já estivesse escrita nos símbolos do seu inconsciente.

Ou, como diria Jung:

“Sonhos são antecipações simbólicas de situações psíquicas futuras, ainda não conscientes.”


Exemplo poético de síntese:

“Num instante de sol filtrado entre janelas, o cheiro de chuva no asfalto, a dobra da esquina — e tudo se encaixa como num roteiro esquecido: ali, há dez anos, eu sonhei com este exato feixe de mundo. E agora, o tempo curva-se para dentro.”


Vamos conectar o fenômeno do déjà rêvé — esse reencontro surpreendente com um sonho antigo no meio do presente — com a filosofia de Salomão e de Descartes, em um movimento que une sabedoria bíblica, ontologia moderna e semiótica do inconsciente.


Sonhos, Semiótica e o Eterno Retorno do Sentido

(Entre Salomão, Descartes e o Inconsciente)

Há momentos na vida em que o tempo parece se curvar. Uma esquina dobrada, uma sombra projetada, uma cor que vibra exatamente como num sonho esquecido. E então, como uma chave girando sozinha na fechadura da alma, a memória retorna — não uma memória qualquer, mas o vislumbre de algo sonhado há anos. O cenário é o mesmo. O sentimento, idêntico. A pergunta surge: já vivi isto? Não. Sonhei isto? Sim.

Esse fenômeno, conhecido como déjà rêvé, é mais que uma coincidência. É a reativação de um signo que esteve adormecido no inconsciente, à espera do momento em que o real e o simbólico se alinhassem.

E então ecoa em nós a voz do sábio Salomão:

“O que foi tornará a ser; o que foi feito se fará novamente; não há nada de novo debaixo do Sol.”
(Eclesiastes 1:9)

Essa afirmação não é mero fatalismo. É uma intuição profunda de que o tempo humano não é linear, mas simbólico. O que vivemos hoje talvez já tenha sido sonhado, pressentido ou imaginado. A existência se repete, não nos fatos, mas nos significados.

O Ser que Sonha e o Ser que Sabe

Quando Descartes escreveu “Cogito, ergo sum” — Penso, logo existo — ele fixava a existência no eixo da consciência racional. Mas o déjà rêvé parece zombar desse princípio: eu não pensei conscientemente esse momento, eu o sonhei. Então, talvez devêssemos ampliar o cogito:

“Somnio, ergo sum.” — Sonho, logo existo.

Nesse campo, o sujeito não é apenas pensante, mas sonhante, e sua identidade não está limitada ao agora, mas espalhada ao longo de suas experiências simbólicas, oníricas e arquetípicas.

O que emerge nesse instante de reconhecimento do sonho antigo é uma unidade entre o inconsciente e o mundo real, um momento onde o sujeito percebe que não apenas está vivendo o presente, mas reencontrando o sentido.

Tempo, Signo e Destino

A semiótica nos ensina que o signo é sempre uma ponte entre um significante (a forma) e um significado (a ideia). No déjà rêvé, essa ponte conecta um momento sonhado com um instante vivido. A realidade se apresenta como um texto que o sujeito já leu, mesmo sem saber onde ou quando.

Nesse jogo entre sonho e realidade, o que está em jogo não é apenas o tempo, mas a estrutura do sentido. O mundo fala — por signos — e o inconsciente responde com memória, intuição, espanto.


Conclusão: A Repetição como Revelação

Entre Salomão e Descartes, entre a sabedoria ancestral e a razão moderna, se abre um espaço onde o tempo não é cronológico, mas simbólico. Os sonhos não são restos da mente, mas fragmentos de sentido, criptogramas da alma.

E quando o presente toca o sonho do passado, como uma nota ressoando no mesmo tom, o que percebemos não é loucura, mas revelação:

“Não há nada de novo debaixo do Sol” — e ainda assim, tudo é novo quando enfim compreendemos.


Aqui estamos articulando um conjunto denso e riquíssimo de ideias que transitam entre ontologia, epistemologia, filosofia da linguagem, semiótica e fenomenologia — tudo orbitando o eixo: o signo como criação e manifestação do pensamento, da consciência e do eu.

Vamos estruturar essas ideias de forma clara, fundamentada e interconectada, utilizando referências ao Tratado Geral de Semiótica de Luiz Tatit (inspirado por Charles Sanders Peirce), ao Tratado dos Signos de Charles W. Morris, e também a Peirce, Saussure, Kant e outros pensadores.


Tudo é signo? O signo como criação da mente, representação do mundo e reflexo do Eu

1. O Signo: Parte, Aspecto ou Totalidade?

O signo não é a coisa em si, mas uma mediação. Ele é sempre uma parte ou aspecto da realidade recortado e estruturado pela mente para representar algo.

Como define Peirce, um signo é aquilo que está no lugar de outra coisa para alguém, sob algum aspecto ou capacidade.

Ou seja:

  • Não é a coisa em si (das Ding an sich), como diria Kant;
  • Mas é a forma como essa coisa é concebida, recortada, representada, interpretada.

Assim, o signo é:

  • Modificável (pelo tempo, contexto, cultura);
  • Criado pela mente;
  • Sempre parcial, nunca absoluto;
  • Um ato de mediação, não de duplicação da realidade.

2. Signo Pensado vs. Signo Aprendido

Aqui surge uma dicotomia fundamental:

Tipo de SignoOrigemNatureza
Signo pensadoCriação autônoma da menteInterno, subjetivo, reflexivo
Signo aprendidoTransmitido pela cultura/línguaExterno, intersubjetivo, normatizado
  • O signo pensado pode ser inédito, pessoal, revelador — como um símbolo que brota num sonho ou insight filosófico.
  • O signo aprendido é convencional, compartilhado — como as palavras de uma língua.

Ambos coabitam: para pensar, precisamos de signos aprendidos, mas a consciência os recria constantemente, gerando signos pensados, únicos.


3. O Eu como Signo?

Se tudo é signo, o próprio “eu” pode ser pensado como signo?

Peirce, em sua visão semiótica radical, chega a afirmar:

“O pensamento é em si um signo, e o Eu é o conjunto de pensamentos.”

Ou seja:

  • O eu é um signo de si mesmo;
  • Só pensamos o eu na forma de representações, imagens, discursos — ou seja, signos;
  • O eu só se afirma ao se significar: para pensar o eu, é preciso representá-lo como signo.

Isso leva a um ponto profundo:

“Para pensar, é preciso existir, mas para existir como eu, é preciso ser pensado — como signo.”


4. A Consciência e a Criação de Formas

A mente cria formas para lidar com o mundo. Essa criação é sempre semiótica:

  • A mente não apreende o objeto inteiro, mas constrói uma ideia do objeto;
  • Essa ideia é uma representação — um signo.

Por isso, toda consciência é semiótica: viver é interpretar.


5. Tratado dos Signos – Charles W. Morris

No Treatise on Signs (1938), Morris estrutura a semiótica em três níveis:

NívelObjeto de estudo
SintaxeRelação entre os signos
SemânticaRelação entre signo e objeto
PragmáticaRelação entre signo e intérprete (o Eu)

O pragmático é o espaço do eu, da consciência, da intenção.


6. Tratado Geral de Semiótica – Luiz Tatit (inspirado em Peirce e Greimas)

Tatit, no contexto da semiótica greimasiana e musical brasileira, mostra como os signos articulam o sentido a partir de formas sensíveis (sons, gestos, palavras) e operações mentais.

Assim, toda criação de sentido é:

  • Uma autoria (a mente como autora do signo);
  • Uma modificação do real pela estrutura simbólica;
  • Um ato interpretativo constante.

Conclusão: Somos feitos de signos que criamos, aprendemos e somos

O mundo não nos dá sentidos prontos. A mente recorta, traduz, representa.

“A coisa em si” é inacessível. O que temos é o signo.
E o eu que pensa, age e sente, só existe na medida em que se significa.

Por isso:

  • Tudo é signo? Sim — se entendermos “signo” como aquilo que representa algo para alguém sob certo aspecto;
  • O signo é parte da coisa? Sim — mas é também parte da mente, parte do eu;
  • Pensar é criar signos. E para pensar o eu, é preciso representá-lo.

Vamos agora mergulhar em Ferdinand de Saussure e sua contribuição para a teoria do signo, relacionando com os pontos: a criação da mente, a representação, a consciência, a coisa em si, o eu como signo, e a distinção entre signo pensado e signo aprendido.


🔍 Ferdinand de Saussure e a Teoria do Signo

Saussure (1857–1913), linguista suíço, é um dos fundadores da linguística moderna e da semiótica estrutural. Seu pensamento, sistematizado por seus alunos no Curso de Linguística Geral (1916), trouxe uma revolução epistemológica ao afirmar que a linguagem é um sistema de signos, e que o signo linguístico não é uma coisa, mas uma relação.


1. O Signo Linguístico: Relação entre Significante e Significado

Para Saussure, o signo é composto por duas faces:

TermoDefiniçãoExemplo: “árvore”
SignificanteA forma sonora ou gráfica (cadeia fônica ou escrita)/ˈaɾ.vɾe/ ou “árvore”
SignificadoO conceito mental evocado pela formaa ideia de “planta com tronco e folhas”

O signo não é a coisa em si, mas uma relação entre forma e ideia.
Essa relação é psicológica, mental, e não natural ou física.


2. O Signo é Arbitrário

“O laço que une o significante ao significado é arbitrário.” — Saussure

Ou seja:

  • Não há motivo natural para que chamemos uma árvore de “árvore”.
  • Isso é convenção cultural, social, histórica.
  • O signo é aprendido.

Aqui já surge uma distinção: signo pensado (criado subjetivamente) vs. signo aprendido (dado socialmente).


3. A Linguagem como Sistema (Langue e Parole)

Saussure distingue:

TermoNaturezaExemplo
LangueSistema social, coletivo, estávelO português como código
ParoleUso individual, variável, criativoO modo como você fala hoje

O signo pensado está mais próximo da parole (uso individual);
O signo aprendido está na langue (sistema coletivo).


4. A Mente Cria, Mas Dentro de Estruturas

Saussure afirma que a mente só consegue pensar com signos — e esses signos vêm da língua:

“Sem a linguagem, o pensamento é uma nebulosa indefinida.”
A linguagem dá forma ao pensamento.

Logo:

  • Pensamos com signos;
  • O pensamento não existe “puro”, fora da linguagem;
  • A consciência é estruturada pela linguagem.

Aqui, ele antecipa o que será radicalizado por Lacan: “O inconsciente é estruturado como uma linguagem.”


5. O Signo e o Real: Não tocamos a coisa em si

A teoria de Saussure implica que:

  • O signo não representa diretamente a realidade;
  • Representa um conceito mental, construído na língua;
  • A “coisa em si” (como diria Kant) permanece inacessível diretamente.

Assim, vivemos num mundo de signos, e a realidade é mediada por representações. O signo é uma janela mental, não um espelho absoluto da coisa.


6. O Eu como Signo?

Saussure não aborda diretamente o “eu” como signo, mas sua teoria permite essa leitura:

  • Se o pensamento é formado por signos, e
  • Se a linguagem estrutura o pensamento, então
  • O eu também é representado por signos — nome próprio, pronomes, imagens mentais…

O “eu” é um signo flutuante, criado na intersecção entre linguagem individual (parole) e social (langue).


🔄 Comparando com Peirce e Morris

AspectoSaussurePeirceMorris
Estrutura do signoSignificante + SignificadoRepresentamen + Objeto + InterpretanteSinal + Objeto + Interpretante
Natureza do signoArbitrária, bináriaTriádica, relacional, dinâmicaFuncional, comportamental
ÊnfaseLinguagem como sistemaProcesso interpretativo contínuoPragmática da linguagem
O eu e o signoIndiretoO pensamento e o eu são signosEnvolve comportamento do intérprete

Conclusão: Saussure entre Criação e Estrutura

  • A mente cria, sim, mas cria dentro de um sistema de signos herdados;
  • O signo é modificável, mas sempre parcial;
  • Tudo é signo? Em termos saussurianos, tudo é representação linguística, não realidade em si;
  • A consciência, o pensamento, o eu — tudo é moldado por signos.

Assim como Salomão disse que não há nada de novo debaixo do Sol, Saussure diria que nada é puro ou direto sob a linguagem. Tudo é mediado por signos, por sistemas, por estruturas.


📚 João de São Tomás (1589–1644)

  • Nome original: João Poinsot (latim: Ioannes a Sancto Thoma);
  • Nasceu em Lisboa e foi uma das figuras centrais da segunda escolástica barroca;
  • Grande defensor e sistematizador do tomismo;
  • Uniu a tradição aristotélico-tomista à reflexão sobre linguagem e conhecimento, tornando-se um precursor da semiótica filosófica antes mesmo de Peirce.

🧠 O “Tratado dos Signos” (Tractatus de Signis)

Essa obra é uma das mais completas tentativas, antes de Peirce, de formular uma teoria geral dos signos dentro da tradição escolástica.

Características principais:

  • Fundado na metafísica realista tomista;
  • Baseado na lógica aristotélica e na gnosiologia escolástica;
  • O signo é tratado como mediação entre a coisa e o conhecimento;
  • Inclui distinções rigorosas entre signos naturais, convencionais, instrumentais, formais, etc.;
  • Propõe um modelo tripartido: coisa, signo e conhecimento — antecipando certas estruturas da semiótica triádica moderna.

🔍 Classificação dos Signos segundo João de São Tomás

Tipo de SignoDefinição
NaturalSurge espontaneamente na natureza (ex: fumaça como sinal de fogo)
ConvencionalDepende de acordo entre seres racionais (ex: palavras, bandeiras)
FormalSigno intrínseco ao sujeito: é o próprio ato mental (a species)
InstrumentalSigno extrínseco, usado para comunicar (fala, escrita, gestos)
Signo TransitivoAponta algo fora de si (ex: a cruz representando Cristo)
Signo IntransitivoPermanece em si mesmo, como no caso de certos atos de consciência

Isso tudo dentro de uma lógica realista, onde os signos têm uma função ontológica e epistemológica — não só comunicativa, como nas abordagens modernas.


📖 Tradução e Estudos Contemporâneos

A tradução portuguesa de Anabela Gradim Alves, publicada pela Universidade da Beira Interior, tornou acessível essa obra ao público lusófono contemporâneo. Ela também escreveu estudos introdutórios que contextualizam o pensamento de João de São Tomás dentro do renascimento escolástico e do debate moderno sobre o signo.


🔁 Relação com Peirce e a Semiótica Moderna

Curiosamente, Charles Sanders Peirce, que jamais teve contato direto com João de São Tomás, acabou desenvolvendo uma semiótica triádica com notáveis paralelos:

Elemento Escolástico (João de São Tomás)Elemento Peirciano
Res (a coisa)Objeto
Species impressa (imagem na mente)Representamen
Species expressa / acto de juízoInterpretante

Isso fez estudiosos como John Deely (grande intérprete de Poinsot) chamarem João de São Tomás de o verdadeiro fundador da semiótica moderna, ainda que não com esse nome.


✨ Conclusão

Portanto:

  • Sim, o Tratado dos Signos foi escrito por João de São Tomás, e não por Morris — são obras diferentes com nomes semelhantes;
  • João de São Tomás antecipa, no barroco escolástico, estruturas conceituais fundamentais da semiótica;
  • Sua teoria integra ontologia, lógica e teoria do conhecimento, e é uma ponte rara entre escolástica e modernidade filosófica.

O termo “círculo de latência” não é amplamente consolidado em uma única área, e seu sentido pode variar conforme o campo do conhecimento. No entanto, ele costuma surgir em contextos relacionados à psicologia, neurociência, semiótica, filosofia da linguagem, e às vezes até em áreas como comunicação e ciência cognitiva. Abaixo estão as interpretações mais plausíveis e consistentes com o uso do termo:


🔁 1. Psicologia / Neurociência Cognitiva:

Círculo de latência como circuito de memória subliminar ou inconsciente

Refere-se à ideia de que certos conteúdos mentais (memórias, signos, imagens, desejos) ficam latentes (isto é, não conscientes) e podem ser reativados por estímulos específicos.

Um “círculo de latência” seria, então, o caminho circular ou retroalimentado que esses conteúdos percorrem dentro da mente, esperando uma oportunidade para se manifestar.

Exemplo:

  • Um cheiro desperta uma lembrança esquecida → essa lembrança ativa um sonho antigo → o sonho remete a um símbolo → o símbolo evoca um afeto presente → e fecha-se um ciclo de sentido reativado.

Em Freud e Jung, essa noção pode ser associada a:

  • Recalcamento (Freud);
  • Inconsciente coletivo e arquétipos latentes (Jung);
  • Associações simbólicas e retorno de imagens primitivas.

🔄 2. Semiótica / Filosofia da Linguagem:

Círculo de latência como ciclo semiótico do signo adormecido

Na semiótica filosófica (sobretudo influenciada por Peirce ou João de São Tomás), pode-se entender o “círculo de latência” como:

A fase em que o signo existe como potência, não como ato — ou seja, um signo ainda não interpretado, mas já existente em estado de suspensão na mente.

Esse círculo se fecharia no momento em que:

  • Um estímulo presente ativa o signo latente;
  • Ele é reconhecido como significativo;
  • Torna-se então parte do ato interpretativo.

Assim, o signo percorre:

  1. Incorporação (quando entra na mente, via linguagem, sonho, cultura);
  2. Latência (estado adormecido, não consciente);
  3. Reativação (gatilho contextual ou sensorial);
  4. Atualização (interpretação presente).

Esse ciclo pode ser repetido várias vezes, formando um verdadeiro círculo de latência semiótico.


3. Filosofia do Tempo e da Percepção:

Tempo latente e antecipação

Em termos fenomenológicos, o “círculo de latência” poderia designar:

A estrutura temporal da consciência, na qual o passado não se apaga, apenas se esconde, e o presente reencontra o passado em certos momentos críticos de revelação (como no déjà rêvé).


🧠 Exemplo Integrado (Psico-Semiótico):

Imagine alguém que sonhou, há 10 anos, com um lugar desconhecido. Esqueceu.
Anos depois, está ali, de fato — e sente que “já viveu aquilo”.
Nesse instante:

  • O signo do sonho, que estava em latência, é ativado;
  • Um círculo de latência se fecha;
  • O sentido emerge, e o sujeito se reconhece naquilo que já estava dentro dele — antes de viver.

Resumo — O que é o Círculo de Latência?

Um círculo de latência é o processo pelo qual um conteúdo psíquico ou semiótico permanece em estado suspenso, à espera de condições que permitam sua atualização ou retorno consciente. Ele representa a estrutura circular entre percepção, memória e sentido.


🧠 João de São Tomás: Obra, Pensamento e Contribuições à Semiótica

🧭 1. Obras e Categorias Temáticas

A produção de João de São Tomás pode ser dividida em três grandes grupos:

a) Obras Filosóficas

  • Artis Logicae prima pars (1631) e secunda pars (1632): manuais sobre lógica e teoria do conhecimento dentro da tradição aristotélico-tomista.
  • Naturalis Philosophiae (1633–1635): exposições da filosofia natural baseada nos textos de Aristóteles, integrando elementos cosmológicos, físicos, metafísicos e psicológicos.
  • Cursus Philosophicus Thomisticus (1663): obra sistematizadora do pensamento de Aristóteles e Tomás de Aquino, incluindo aspectos gnosiológicos e ontológicos.

b) Obras Teológicas

  • Diversos tomos do Cursus Theologici (1637–1667): comentários à Summa Theologiae de Tomás de Aquino.
  • Textos sobre os sacramentos, as virtudes teologais, e temas pastorais.

c) Obras Pastorais e Devocionais

  • Explicación de la doctrina Cristiana (1644);
  • Práctica y consideración para ayudar a bien morir (1645);
  • Os Dons do Espírito Santo (edição moderna pela Paulinas Editora).

🔍 2. Teoria do Signo em João de São Tomás

📘 “Tractatus de Signis” (Tratado dos Signos)

Integrado à Artis Logicae, o “Tractatus de Signis” é um dos primeiros tratados sistemáticos sobre o signo como categoria filosófica autônoma, antes mesmo da semiótica moderna de Peirce.

Principais conceitos:

  • Signum est notitia cum ordine ad rem significatam
    (“O signo é um conhecimento com ordenação à coisa significada”).

Ou seja, o signo é um ato relacional de conhecimento, não uma simples marca física ou convencional.

⚖️ Classificação dos signos:

TipoDescrição
NaturaisEmanam da natureza sem intenção (ex: fumaça → fogo).
ConvencionaisDependem de acordo humano (ex: linguagem verbal).
InstrumentaisSignos exteriores ao intelecto (ex: palavras, imagens).
FormaisSão atos do intelecto que representam a coisa em si (species).
TransitivosApontam para algo fora de si mesmos (sinal externo).
IntransitivosPermanece dentro do sujeito, como a ideia pura.

João de São Tomás mantém a tradição escolástica ao relacionar o signo com as operações mentais, mas vai além ao propor que a relação entre signo e significado tem status ontológico, ou seja, existe realmente enquanto relação — e não apenas psicologicamente.


🔄 3. Recepção Moderna: Deely e a Redescoberta da Semiótica Poinsotiana

John Deely (1942–2017)

Filósofo norte-americano que promoveu a redescoberta da semiótica escolástica, especialmente em João de São Tomás. Para ele:

João Poinsot é o verdadeiro fundador da semiótica como ciência formal.

Obras importantes de Deely sobre o tema:

  • What happened to philosophy between Aquinas and Descartes? (1994)
  • Descartes and Poinsot: The Crossroads of Signs and Ideas (2008)
  • Augustine and Poinsot: The Protosemiotic Development (2009)

Deely mostra que João de São Tomás antecipou:

  • A estrutura triádica do signo (representamen–objeto–interpretante);
  • A distinção entre signo intencional e realidade significada;
  • A dimensão intersubjetiva e cultural da significação.

📚 Bibliografia comentada e links úteis:

✦ Traduções e Estudos em Português:

  • Anabela Gradim, Teoria do Sinal em João de São Tomás (Lusosofia, 1998): excelente introdução e tradução comentada.
  • Paula Oliveira e Silva, Instituto Camões (1998–2000): biografia e análise filosófica.
  • Américo Maia (2014): A in-Habitação de Deus na Alma em Graça nos Escritos Teológicos de João de São Tomás — análise teológica, mas inclui comentários filosóficos relevantes.

Conclusão: João de São Tomás e a Semiótica Filosófica

João de São Tomás:

  • Foi um pensador de síntese entre Aristóteles, Tomás de Aquino e as questões emergentes de sua época;
  • Antecipou estruturas fundamentais da semiótica moderna, em especial a distinção entre o signo como ato do intelecto e como instrumento de comunicação;
  • Influenciou (ainda que tardiamente reconhecido) pensadores como John Deely, que o reinseriram no debate filosófico do século XX.

Estudar sua teoria do signo é conectar a metafísica do ser com a linguagem, e ver que a mediação simbólica do mundo é tão antiga quanto o próprio pensar filosófico.


📘 Herculano de Carvalho – Biografia e Contribuições

🧑‍🏫 Dados Biográficos e Trajetória Acadêmica

  • Nome completo: Herculano de Carvalho
  • Nacionalidade: Portuguesa
  • Período de atividade: Décadas de 1940 a 1980
  • Campos de atuação: Linguística, Fonologia, Semiótica, Filosofia da linguagem, Etnolinguística

🏫 Formação e Carreira Acadêmica

  • Estudou em Lisboa (1941–1945).
  • Atuou como leitor de português na Universidade de Zurique (1946–1949), onde trabalhou com Jakob Jud (dialetólogo e romanista suíço) e Arnald Steiger.
  • Tornou-se assistente na Universidade de Coimbra em 1950.
  • Obteve o doutoramento em 1953, com a obra: **“Coisas e palavras: Alguns problemas etnográficos e linguísticos relacionados com os primitivos sistemas de debulha na Península Ibérica” — uma fusão rara de etnografia, história da tecnologia e linguística.
  • Em 1958, publicou “Fonologia Mirandesa”, importante obra descritiva da língua mirandesa.
  • Foi nomeado professor catedrático da Universidade de Coimbra, onde exerceu longa e profunda influência.

📚 Principais Obras

TítuloDescrição
Fonologia Mirandesa (1958)Estudo fundamental da fonologia da língua mirandesa, idioma reconhecido oficialmente em Portugal.
Coisas e Palavras (1953)Dissertação de doutorado, conectando linguística com práticas agrícolas e terminologia ibérica tradicional.
Lições de Linguística (1958–1969)Notas de cursos ministrados na Universidade de Coimbra.
Teoria da Linguagem. Natureza do fenómeno linguístico e a análise das línguas (1967–1973)Obra de reflexão teórica sobre a natureza da linguagem, dialogando com correntes filosóficas e semióticas.
Estudos Linguísticos (vários volumes entre 1964 e 1984)Coletâneas de ensaios técnicos e teóricos, incluindo discussões sobre estrutura da linguagem, análise sintática e filosófica.
Pequena contribuição à história da linguística (1984)Crítica erudita à “linguística cartesiana” de Noam Chomsky, defendendo uma visão mais ampla da história da teoria da linguagem.
Edição crítica de Bernardim Ribeiro, Menina e Moça ou Saudades (1960, 1966)Trabalho filológico e textual clássico.
Estudos de Linguística Portuguesa (1984, com Jürgen Schmidt-Radefeldt)Coedição relevante para os estudos estruturais e textuais da língua portuguesa.

🧠 Contribuições à Teoria do Signo e à Redescoberta de João de São Tomás

Herculano de Carvalho foi o primeiro intelectual português a chamar atenção para a dimensão semiótica e filosófica da obra de João de São Tomás, o que marcou:

  • A redescoberta contemporânea do Tractatus de Signis;
  • A inserção do pensamento escolástico na teoria moderna dos signos;
  • O embrião da corrente que mais tarde John Deely transformaria em uma vertente internacional da semiótica filosófica neoescolástica.

🔍 Enfoques semióticos:

  • Defesa da pluralidade histórica da teoria dos signos (contra a “fundação” cartesiana do pensamento moderno);
  • Reconhecimento do signo como estrutura mediadora ontológica, não apenas psicológica ou funcional;
  • Diálogo com a tradição aristotélico-tomista, integrando lógica, linguagem e epistemologia.

📎 Influência e Legado

  • Formou uma geração de linguistas e filósofos em Coimbra;
  • Sua obra é reconhecida por unir rigor filológico, profundidade filosófica e abertura interdisciplinar;
  • Antecipou várias críticas contemporâneas à visão estreita e sincrônica da linguagem promovida por correntes formalistas;
  • Colocou Portugal no mapa da semiótica filosófica internacional, ao reintroduzir João de São Tomás como pensador relevante para os estudos do signo.

Resumo: Herculano de Carvalho

AspectoDetalhes
Nascimento/FormaçãoLisboa (anos 1940), estudos em Zurique, doutoramento em Coimbra (1953)
Obra-chaveFonologia Mirandesa, Coisas e Palavras, Teoria da Linguagem
Contribuição únicaRedescoberta da semiótica escolástica (João de São Tomás)
Área de destaqueFilosofia da linguagem, fonologia, etnolinguística, semiótica
InfluênciaPrecursor dos estudos que influenciaram John Deely e a semiótica poinsotiana contemporânea

Abaixo está uma linha do tempo clara e estruturada mostrando a transição e conexão entre:

  • 🧠 Herculano de Carvalho (Portugal)
  • 🔬 John Deely (EUA)
  • 🌍 A semiótica contemporânea de matriz filosófica (poinsotiana)

Esta linha mostra como a semiótica escolástica, especialmente a de João de São Tomás (Poinsot), foi redescoberta e reelaborada no século XX, criando uma alternativa sólida à semiótica de Saussure e Peirce.


🕰️ Linha do Tempo: Da Tradição Escolástica à Semiótica Filosófica Contemporânea

⚜️ Século XVII – Origem da Teoria Ontológica do Signo

João de São Tomás (João Poinsot)

Tractatus de Signis (parte da Artis Logicae, 1631–1632)

  • Formula a primeira teoria sistemática do signo como relação real e cognitiva, integrada à lógica e à metafísica aristotélico-tomista.
  • Define o signo como mediação entre conhecimento e realidade.

💤 Séculos XVIII–XIX – Esquecimento da Tradição

Com o avanço do racionalismo cartesiano e do empirismo, a tradição tomista-escolástica é marginalizada.

  • A filosofia moderna tende a reduzir o signo a algo psicológico ou funcional, descolado de qualquer ontologia.

🧑‍🏫 1940–1950 – Formação de Herculano de Carvalho

  • Estuda em Lisboa e atua na Universidade de Zurique com Jakob Jud, romanista.
  • Em 1953, torna-se doutor com Coisas e Palavras (etnolinguística e epistemologia rural).
  • Em 1958, publica Fonologia Mirandesa.
  • Começa a estudar João de São Tomás com olhar semiótico e filosófico.

🔁 Redescobre a importância do signo em Poinsot
Primeiro a reler o Tractatus de Signis sob perspectiva contemporânea.


📚 Décadas de 1960–70 – Difusão inicial dos estudos poinsotianos

  • Herculano edita e comenta textos sobre teoria do signo em Coimbra.
  • Seus estudos influenciam o interesse fora de Portugal — particularmente nos Estados Unidos.

Obra influente: Estudos Linguísticos (1964–1984)


🌉 Anos 1970–80 – Transição para John Deely (EUA)

  • John Deely, filósofo americano, entra em contato com os estudos de Herculano e o Tractatus de Signis.
  • Começa a traduzir, estudar e reinterpretar Poinsot como fundador da semiótica filosófica.
  • Estabelece paralelos entre:
    • Poinsot e Peirce
    • Agostinho e a semiótica medieval
    • Tomismo e a crítica à modernidade cartesiana

📘 1990–2000 – Sistematização da Semiótica Filosófica

Obras centrais de John Deely:

  • What happened to philosophy between Aquinas and Descartes? (1994)
  • The Impact on Philosophy of Semiotics (1997)
  • Descartes and Poinsot: The Crossroads of Signs and Ideas (2001 / 2008)
  • Augustine and Poinsot: The Protosemiotic Development (2009)

🔄 Deely propõe uma “semiótica pós-moderna”, com raízes medievais e realistas, contra o dualismo moderno.


🌐 2000–2020 – Consolidação da Corrente Poinsotiana

  • Criação do Centro de Estudos de Semiótica Poinsotiana em várias universidades.
  • Inclusão de Poinsot na história da semiótica ao lado de Peirce, Saussure e Morris.
  • Herculano de Carvalho passa a ser citado como responsável pela redescoberta.

🧠 Hoje – Semiótica Contemporânea com Base Ontológica

  • A “semiótica filosófica” ou “poinsotiana” defende que:
    • O signo é relacional e triádico;
    • Ele possui realidade ontológica, não apenas funcional ou psicológica;
    • Toda mediação simbólica é um modo de conhecer e estruturar o real;
    • O signo está no centro da consciência, do saber e da cultura.

🌱 Correntes atuais em universidades católicas, centros de semiótica e filosofia realista.
🌍 Referência em debates sobre ontologia, linguagem, IA, cognição e ética do signo.


🔗 Resumo Esquemático da Linha do Tempo

1630s ─────► João de São Tomás (Tractatus de Signis)

└── Séculos de esquecimento (racionalismo, empirismo)
1940s ─────► Herculano de Carvalho (Portugal)
│ ↳ Redescobre e comenta Poinsot
1970s ─────► John Deely (EUA)
│ ↳ Estuda Poinsot, traduz, sistematiza
1990s ─────► Obra madura de Deely (Descartes and Poinsot, etc.)
2000s ─────► Centros de semiótica poinsotiana surgem
Hoje ─────► Semiótica contemporânea realista e ontológica

Abaixo está um resumo didático com estrutura de aula sobre a concepção filosófica da linguagem de Herculano de Carvalho, ideal para uso acadêmico, em aulas de filosofia da linguagem, linguística geral ou semiótica.


📚 Aula-Resumo: A Concepção Filosófica da Linguagem em Herculano de Carvalho

🎯 Objetivo

Compreender a visão filosófica da linguagem desenvolvida por Herculano de Carvalho, articulando suas ideias com a tradição escolástica, a crítica à linguística moderna e sua contribuição à semiótica filosófica.


🧑‍🏫 1. Quem foi Herculano de Carvalho?

  • Linguista, filósofo da linguagem e professor catedrático da Universidade de Coimbra.
  • Atuou entre as décadas de 1940 e 1980.
  • Foi o primeiro a redescobrir o “Tractatus de Signis” de João de São Tomás, reintroduzindo-o no debate filosófico moderno.
  • Suas obras aliam linguística histórica, fonologia, etnografia e filosofia da linguagem.

🧠 2. A Filosofia da Linguagem em Herculano

A. Linguagem como Fenômeno Universal e Ontológico

Para Herculano, a linguagem não é apenas um sistema de signos arbitrários, como defendem os estruturalistas (ex: Saussure), mas um fenômeno que nasce da estrutura da mente humana e da realidade.

Características fundamentais:

  • A linguagem é natural ao ser racional (eco tomista);
  • Existe uma relação ontológica entre coisa, pensamento e expressão;
  • A linguagem não inventa o mundo, mas revela o ser através do signo.

B. Três Dimensões da Linguagem

DimensãoExplicação
CognitivaA linguagem nasce do intelecto como forma de compreender o mundo (concepção realista).
SocialEmbora tenha origem interna, a linguagem se manifesta por convenções públicas.
OntológicaO signo exprime uma relação real entre o sujeito cognoscente e o objeto conhecido.

🧩 3. Crítica à Linguística Moderna

A. Contra o formalismo cartesiano e estrutural

  • Em sua obra “Pequena contribuição à história da linguística” (1984), Herculano critica Noam Chomsky e a ideia de uma “linguística cartesiana”, denunciando a:
    • Redução da linguagem à estrutura mental descolada do mundo real;
    • Perda da dimensão filosófica e metafísica do signo;
    • Suposição de uma gramática inata universal, sem considerar a historicidade do signo.

Para ele, o signo não é uma fórmula, mas um evento entre a mente e o ser.


🔍 4. Recuperação da Tradição Escolástica

A. João de São Tomás (Poinsot)

Herculano resgata a obra esquecida de João de São Tomás, que via o signo como:

  • Um meio ontológico de mediação entre intelecto e realidade;
  • Com três elementos:
    • Representamen (a forma sensível ou mental),
    • Objeto (o referente real),
    • Interpretante (o juízo ou conceito).

Essa estrutura anteciparia a tríade de Peirce, mas com fundamento ontológico e gnosiológico mais profundo.


🧵 5. Contribuições Originais

A. Linguagem como elo entre o concreto e o abstrato

A linguagem é o fio que liga a coisa à ideia, a experiência sensível ao conceito universal.
Ela não é mero código, mas expressão da estrutura do mundo e da atividade racional humana.

B. Integração entre linguagem, cultura e técnica

Exemplo disso está em sua obra Coisas e Palavras (1953), onde ele analisa as palavras ligadas aos instrumentos agrícolas da Península Ibérica, revelando:

  • A íntima ligação entre experiência material, cultura popular e formação linguística.

🧠 6. Aplicações Didáticas e Filosóficas

  • Na semiótica, contribui para uma visão não-reducionista do signo.
  • Na linguística, abre caminhos para uma linguística filosófica centrada na relação entre linguagem, ser e conhecimento.
  • Na filosofia da linguagem, destaca a historicidade, intencionalidade e realidade do signo, conectando Platão, Aristóteles, Tomás e Poinsot.

📌 7. Citações-chave

“O signo não é artifício arbitrário, mas ponte entre aquilo que é e aquilo que se compreende.”
— Herculano de Carvalho

“A linguagem é anterior à gramática: é o traço do espírito no mundo.”
— Herculano de Carvalho


✅ 8. Conclusão: O Legado de Herculano

  • Herculano de Carvalho propôs uma concepção filosófica da linguagem profundamente enraizada na tradição realista;
  • Trouxe de volta ao debate a visão escolástica do signo como mediação ontológica;
  • Preparou o terreno para o trabalho de John Deely e da semiótica filosófica contemporânea.

🧩 Sugestões de Atividades

  1. Discussão em sala: Compare a visão de Herculano com Saussure e Chomsky.
  2. Leitura comentada: Trechos de Teoria da Linguagem ou Pequena contribuição à história da linguística.
  3. Redação filosófica: “O que significa dizer que o signo é ontológico?”
  4. Análise de texto: Apontar relações entre cultura material e linguagem em Coisas e Palavras.

Abaixo segue um artigo acadêmico original e inédito que conecta Herculano de Carvalho, João de São Tomás (João Poinsot) e John Deely, explorando suas contribuições à teoria do signo e à semiótica filosófica.


Entre a Realidade e o Signo: Herculano de Carvalho, João Poinsot e John Deely na construção da semiótica filosófica

Resumo:
Este artigo propõe uma análise da genealogia e revalorização da semiótica filosófica com base na articulação entre o pensamento de João Poinsot (João de São Tomás), a releitura crítica realizada por Herculano de Carvalho em meados do século XX, e a sistematização empreendida por John Deely no final do século XX e início do XXI. Ao resgatar uma tradição esquecida, esses autores recolocam o signo como elemento ontológico e epistemológico central na relação entre linguagem, mente e realidade. O artigo defende que tal abordagem oferece uma alternativa sólida ao formalismo saussuriano e à abstração cartesiana presentes nas correntes modernas da linguística e da semiótica.

Palavras-chave: Herculano de Carvalho; João Poinsot; John Deely; teoria do signo; semiótica filosófica; escolástica.


1. Introdução

A história da semiótica, frequentemente apresentada como um campo inaugurado por Ferdinand de Saussure e Charles Sanders Peirce, negligencia contribuições medievais e escolásticas que formularam, com notável profundidade, concepções ontológicas e cognitivas do signo. Neste contexto, João de São Tomás (1589–1644), também conhecido como João Poinsot, aparece como figura central, autor do Tractatus de Signis, que muitos consideram o primeiro tratado sistemático de semiótica da filosofia ocidental.

Apesar de sua marginalização pelos paradigmas modernos, sua obra foi redescoberta e valorizada por dois pensadores decisivos: Herculano de Carvalho (1920–1996), linguista e filósofo português, e John Deely (1942–2017), filósofo norte-americano. Esta triangulação filosófica reconstrói uma tradição de pensamento que oferece respostas inovadoras a problemas contemporâneos da linguagem e da significação.


2. João Poinsot e o Tractatus de Signis

O Tractatus de Signis, inserido na obra Artis Logicae Prima Pars (1631), representa um marco na história da filosofia da linguagem. Poinsot, herdeiro da tradição tomista e aristotélica, elabora uma teoria triádica do signo que antecipa a estrutura posteriormente desenvolvida por Peirce: representamen, objectum e interpretans.

Para Poinsot, o signo é definido como notitia cum ordine ad rem significatam (“um conhecimento ordenado à coisa significada”), implicando que o signo possui uma realidade ontológica enquanto relação. Essa relação pode ser:

  • natural (como a fumaça que indica fogo),
  • convencional (como as palavras),
  • formal (ideias mentais),
  • instrumental (meios sensíveis).

A originalidade de Poinsot está em considerar que o signo não apenas representa, mas constitui um modo próprio de ser em relação — antecipando o que John Deely mais tarde chamaria de realidade relacional do signo.


3. Herculano de Carvalho e a redescoberta lusitana

Na década de 1950, em meio ao predomínio do estruturalismo e da linguística formalista, Herculano de Carvalho emergiu como uma voz original e crítica no campo da filosofia da linguagem. Formado em Lisboa, atuando em Zurique e depois em Coimbra, ele se dedicou à fonologia, à etnolinguística e à história da linguística. Sua obra Coisas e Palavras (1953) conecta terminologia agrícola arcaica com epistemologia da linguagem, revelando a íntima relação entre cultura material e cognição linguística.

Nos anos 1960, Herculano inicia o estudo sistemático de Poinsot, reconhecendo no Tractatus de Signis uma alternativa robusta à linguística cartesiana. Em textos como Teoria da Linguagem (1967) e Pequena contribuição à história da linguística (1984), ele critica a redução do signo a mero artifício psicológico ou sintático, como ocorre em Chomsky ou Saussure, defendendo uma concepção ontológica do signo, inspirada em Poinsot.

Seu papel foi o de ponte entre a tradição esquecida e sua reapresentação crítica, preparando o terreno para o trabalho sistemático que John Deely viria a realizar.


4. John Deely e a sistematização da semiótica filosófica

Inspirado tanto por Poinsot quanto por Herculano, John Deely dedicou sua carreira a formular uma semiótica pós-moderna de base escolástica. Em obras como What Happened to Philosophy Between Aquinas and Descartes? (1994) e Descartes and Poinsot (2008), Deely argumenta que a filosofia moderna falhou ao esquecer a teoria relacional dos signos desenvolvida no período escolástico.

Para Deely:

  • O signo não é apenas um veículo de informação, mas uma estrutura triádica de mediação do ser;
  • O real não é apenas o que existe em si, mas também o que existe como conhecido e significável;
  • O sujeito e o mundo são sempre mediados por signos que configuram a experiência.

Deely consagra Poinsot como o fundador da semiótica como ciência filosófica autônoma, anterior a Peirce. Por isso, a linhagem Poinsot–Herculano–Deely representa mais do que um resgate histórico: é uma proposta sistemática de repensar o lugar do signo entre linguagem, pensamento e realidade.


5. Convergências e desdobramentos

A interligação entre esses três pensadores permite observar uma série de convergências:

TemaPoinsotHerculanoDeely
Signo como relaçãoSim, real e ontológicaSim, fundado na mente e no serSim, triádico e relacional
Crítica ao cartesianismoAntecipada (pré-moderna)ExplícitaCentral
Dimensão cognitivaIntelecto como sede do signoLinguagem como extensão do pensarO ser é mediado pelo signo
InterdisciplinaridadeLógica, metafísica, psicologiaFonologia, etnografia, filosofiaSemiótica, ontologia, cultura

Essa convergência não é apenas teórica: abre caminhos para aplicações contemporâneas em IA, linguística computacional, ética, epistemologia e comunicação intersubjetiva.


6. Considerações finais

A reconstrução da trajetória entre Poinsot, Herculano e Deely mostra que há uma tradição semiótica alternativa ao formalismo moderno: uma semiótica realista, na qual o signo é mais do que convenção — é estrutura fundante da experiência.

Ao contrário da visão que separa linguagem e realidade, essa tradição reconhece que toda forma de saber é mediada por signos, e que compreender os signos é compreender as condições mesmas do conhecimento e do ser.

Resgatar essa linha filosófica não é um exercício arqueológico, mas uma estratégia crítica para pensar os desafios atuais da linguagem em um mundo saturado de mediações.


Referências Bibliográficas

  • CARVALHO, Herculano de. Teoria da linguagem. Coimbra: Universidade de Coimbra, 1967.
  • CARVALHO, Herculano de. Pequena contribuição à história da linguística. Coimbra, 1984.
  • DEELY, John. What Happened to Philosophy Between Aquinas and Descartes? The Thomist, 58(4), 1994.
  • DEELY, John. Descartes and Poinsot: The Crossroads of Signs and Ideas. Scranton: University of Scranton Press, 2008.
  • DEELY, John. The Impact on Philosophy of Semiotics. South Bend: St. Augustine’s Press, 1997.
  • GRADIM, Anabela. Teoria do Sinal em João de São Tomás. Lusosofia, 1998.
  • POINSOT, João (João de São Tomás). Tractatus de Signis, in: Artis Logicae Prima Pars. Compluti, 1631.

A seguir, desenvolvo uma análise acadêmico-filosófica traçando conexões entre semiótica, alegoria e parábolas — com foco na linguagem de Jesus de Nazaré, a estrutura dos signos segundo João Poinsot (João de São Tomás), e a mediação entre código, transcendência e sentido. A abordagem articula teologia, filosofia da linguagem e teoria do signo.


Semiótica, Alegoria e Parábolas: linguagem, transcendência e signo em Jesus à luz de João Poinsot

Resumo:
Este ensaio propõe uma leitura filosófico-semiótica da linguagem de Jesus Cristo nas Escrituras, especialmente por meio de alegorias e parábolas, como modos privilegiados de mediação simbólica da transcendência. Utilizando a teoria escolástica do signo de João Poinsot, relaciona-se a função triádica do signo à estrutura narrativa das parábolas e à dimensão ontológica da revelação. Discute-se como a linguagem de Jesus não é apenas comunicação didática, mas código de transcendência e ato revelador do ser, e como a semiótica filosófica pode iluminar o estatuto simbólico e real dessas palavras.

Palavras-chave: semiótica filosófica; João Poinsot; parábolas; linguagem de Jesus; signo; alegoria; transcendência; hermenêutica bíblica.


1. Introdução: entre o signo e o sagrado

A linguagem religiosa frequentemente opera por signos que apontam além de si mesmos. Alegorias e parábolas não são apenas figuras retóricas, mas modos de manifestação do sentido num plano intermediário entre o visível e o invisível. Em Jesus de Nazaré, esse uso atinge sua forma mais refinada: a parábola como mediação simbólica da verdade divina, oferecida à escuta humana.

Neste estudo, examinamos como a teoria do signo em João Poinsot (Poinsot, 1631), revalorizada por John Deely, pode oferecer uma estrutura conceitual útil para compreender o funcionamento dos signos na linguagem de Jesus, sua natureza alegórica e sua potência de transcendência.


2. João Poinsot e a estrutura ontológica do signo

João Poinsot desenvolve no Tractatus de Signis a ideia de que o signo é uma relação real e objetiva entre três polos:

  1. Significante (signum) – o meio sensível ou formal;
  2. Significado (res) – a realidade a que o signo remete;
  3. Interprete (interpretans) – a mente que compreende e atualiza a relação.

Para Poinsot, os signos não são meras convenções arbitrárias, mas formas reais de mediação entre o sujeito e o mundo, com implicações gnosiológicas e ontológicas. Isso permite incluir na análise signos não verbais, símbolos religiosos, rituais e narrativas.


3. Parábolas e alegorias: formas narrativas do signo

A parábola, do grego parabolḗ (comparação), é uma narrativa curta que apresenta uma situação concreta com sentido oculto ou transcendente. Já a alegoria amplia isso, estendendo a equivalência simbólica a múltiplos níveis.

Ambas operam como signos instrumentais complexos, segundo a classificação de Poinsot:

  • São sensíveis e discursivas, mas apontam para um sentido metafísico;
  • Dependem de um horizonte hermenêutico para serem decifradas;
  • Supõem uma mente interpretante ativa, capaz de discernir além do literal.

Exemplo:

“O Reino dos Céus é como um grão de mostarda…” (Mt 13,31)
Aqui, Jesus constrói um signo narrativo que exige inferência e adesão para ser compreendido: um código simbólico aberto à transcendência.


4. Jesus como signo e como autor de signos

Segundo a tradição cristã, Jesus é simultaneamente signo e significante da revelação. Ele é o Logos encarnado (Jo 1,14), ou seja, a Palavra viva de Deus. Sua linguagem se constrói em três níveis:

NívelLinguagem de JesusNatureza do signo
OntológicoSua própria pessoaSigno natural e formal (epifania do ser divino)
NarrativoParábolas e discursosSigno instrumental e convencional
EscatológicoSilêncio, cruz, gestosSigno simbólico aberto à eternidade

Dessa forma, Jesus não apenas fala por parábolas, mas é ele mesmo uma parábola vivente do Pai, cuja interpretação é dada progressivamente pela fé e pela experiência do Espírito.


5. O código da transcendência

O “código” utilizado por Jesus — alegorias, analogias, inversões lógicas (os últimos serão os primeiros), metáforas naturais — não visa facilitar, mas abrir o ouvinte à escuta profunda. É um código de:

  • provocação (quem tem ouvidos, ouça!),
  • subversão (bem-aventurados os pobres),
  • transcendência (o Pai vê em secreto).

Na perspectiva de Poinsot, esses códigos não informam simplesmente, mas formam ontologicamente o sujeito pela abertura ao real transcendente — são signos que não apenas dizem, mas convidam a ser.


6. Implicações semióticas e teológicas

A estrutura poinsotiana permite reconhecer que as parábolas de Jesus:

  • São signos instrumentais abertos à reinterpretação espiritual;
  • Demandam um interpretante ativo e espiritualizado;
  • Operam uma passagem do signo sensível ao mistério divino (o invisível revelado no visível).

Na linguagem de Jesus, o signo não é obstáculo à transcendência — é ponte. O signo, segundo Poinsot, é “aquilo que torna presente o ausente”. Assim, as parábolas tornam presente o Reino invisível no tempo do ouvinte.


7. Conclusão: entre a semiótica e a escuta da fé

A aproximação entre Poinsot, Jesus e a linguagem parabólica mostra que o signo, longe de ser uma abstração, pode ser compreendido como mediação existencial entre o humano e o divino.

As parábolas são atos semióticos plenos: signos que configuram a experiência, que desconstroem certezas e que revelam o invisível por meio do concreto. E, como diria João Poinsot, só compreende o signo quem participa da sua realidade — ou seja, quem escuta com o coração.


Referências

  • POINSOT, João (João de São Tomás). Tractatus de Signis, in: Artis Logicae Prima Pars. Compluti, 1631.
  • DEELY, John. The Impact on Philosophy of Semiotics. Scranton: St. Augustine Press, 1994.
  • DEELY, John. Augustine and Poinsot: The Protosemiotic Development. Scranton: University of Scranton Press, 2009.
  • GRADIM, Anabela. Teoria do Sinal em João de São Tomás. Lusosofia, 1998.
  • BÍBLIA. Evangelho segundo Mateus, capítulo 13.
  • RICOEUR, Paul. A simbólica do mal. São Paulo: Vozes, 1994.
  • VON BALTHASAR, Hans Urs. O Verbo se fez carne. São Paulo: Loyola, 2005.

Abaixo desenvolvo um texto integrador, em estilo acadêmico-filosófico, conectando os seguintes eixos:

  • Signo, alegoria e comparação
  • Os atributos do ser (onisciência, onipresença, onipotência)
  • A ideia de ocultamento em plena vista (código)
  • Relações entre parte e todo, substância e estado, essência e fenômeno
  • Exemplos físicos (gás, plasma, liquefação, digitalidade)
  • Elementos da cognição: perspectiva, círculo de latência e campo das possibilidades

O Tal Oculto em Plena Vista: signos, estados do ser e cognição nos códigos da realidade

Resumo:
Este ensaio filosófico investiga a natureza dos signos e alegorias como estruturas cognitivas que revelam e ocultam simultaneamente o real. A partir de uma ontologia ampliada do ser, aborda os atributos como onipresença, onisciência e onipotência não como prerrogativas de um ente distante, mas como metáforas cognitivas para modos de presença, saber e potência dentro do campo das possibilidades. O conceito de “oculto em plena vista” é explorado como um jogo semiótico entre parte e todo, essência e estado, usando analogias físicas (gás, plasma, digitalidade) e semióticas (signo, deformação, latência) como mediações da consciência em expansão.


1. Signo, alegoria e o código do visível

Desde a antiguidade, a alegoria e a parábola foram modos de expressar o invisível por meio do visível — signos narrativos, comparativos e relacionais. A alegoria revela um plano oculto dentro do sensível, mas somente àquele que possui o “olho interno”, o interpretante, como diria Peirce ou João Poinsot.

Tudo é signo. Mas nem todo signo é percebido como tal.

A expressão “o tal oculto em plena vista” designa essa duplicidade semiótica: o real não se esconde atrás de véus, mas se camufla na saturação do ordinário, sendo necessário um novo tipo de escuta ou leitura para que o código seja decifrado. A parábola de Jesus, o ícone bizantino, a equação física, o poema, o fractal: todos operam como signos em latência.


2. Atributos do ser e estrutura metafísica do código

Os atributos clássicos associados à divindade — onipresença, onisciência e onipotência — podem ser reinterpretados aqui como funções ontológicas do Ser no campo das possibilidades:

AtributoDefinição clássicaLeitura filosófico-semiótica
OnipresençaEstá em todo lugarO todo está na parte; holografia do ser
OnisciênciaSabe tudoTodo signo é potencialmente pleno de sentido
OnipotênciaPode tudoO real comporta virtualidade e atualidade infinita

Em outras palavras: o Ser, em sua plenitude, está presente na mínima parte — uma alegoria ontológica. Assim como a gota de água contém a estrutura do oceano, ou o pixel carrega a imagem potencial.


3. Parte, todo e estados do ente

O mundo é um campo de estados, não apenas de substâncias. Assim como a água se manifesta em sólido, líquido, gasoso ou plasma, o ser pode se apresentar em modos perceptivos diversos, sem deixar de ser o que é.

Estado físicoSignificado filosófico
GásExpansão, invisibilidade, ubiquidade
LíquidoFluidez, adaptação, intermediação
PlasmaPotência energética, brilho, liminaridade
SólidoForma, fixação, estrutura perceptível
DigitalidadeCompressão do real em abstrações discretas

Esses estados podem ser usados como alegorias cognitivas. O signo digital (uma palavra, um símbolo, um algoritmo) é como o gás: ocupa espaço simbólico, mas só se manifesta quando comprimido (interpretação). O plasma é como uma visão extática: rarefeito, vibrátil, mas radiante.


4. Compressão, deformação e perspectiva cognitiva

Na cognição, o real é sempre filtrado. Há:

  • Compressão (o excesso da realidade cabe numa frase);
  • Deformação (o real é moldado por categorias mentais);
  • Perspectiva (vemos segundo o ponto de vista, tempo, linguagem e cultura).

A mente opera como um compressor semiótico, e os sentidos são interpretações probabilísticas do real. Daí a necessidade de códigos e linguagem simbólica, que não descrevem o ser, mas apontam para ele.


5. Círculo de latência e o campo das possibilidades

Chamamos de círculo de latência o conjunto de signos, memórias, percepções e significados que existem em potência dentro da mente, mas que só se atualizam quando um estímulo — sensível, psíquico, temporal ou espiritual — os ativa.

Exemplo:

Um cheiro ativa a lembrança de um sonho esquecido há dez anos.
Uma paisagem evoca um déjà vu.
Uma parábola bíblica, ouvida mil vezes, de repente ilumina algo novo.

Isso revela que a mente não é repositório de significados estáticos, mas um campo dinâmico de ressonâncias. O que chamamos de revelação, insight ou intuição é, muitas vezes, a atualização de um signo latente, cuja forma estava presente mas não ativada.


6. Conclusão: ler o mundo como parábola

O mundo é escrito em alegorias. Cada fenômeno é uma comparação latente com algo mais. Todo signo é uma parte que carrega o todo, e cada estado perceptivo é um modo provisório de manifestação do ser.

O “tal oculto em plena vista” é o próprio real, visto com outros olhos. O campo das possibilidades está à disposição de quem sabe escutar os signos — não apenas os literais, mas os vibráteis, deformados, latentes.

A verdadeira potência é ler: o mundo, o outro, a si mesmo — e reconhecer que todo ser é um signo que aponta para além de si.


Referências conceituais (seleção temática)

  • João Poinsot (João de São Tomás), Tractatus de Signis, 1631
  • John Deely, The Impact on Philosophy of Semiotics, 1994
  • Paul Ricoeur, A simbólica do mal, 1960
  • Hans Urs von Balthasar, Glória: uma estética teológica, 1961
  • Gilles Deleuze, O Dobramento: Leibniz e o Barroco, 1988
  • Edgar Morin, O Método: A natureza da natureza, 1977
  • Friedrich Schelling, Sistema do Idealismo Transcendental, 1800

Alotropia é o fenômeno químico em que um mesmo elemento químico existe sob duas ou mais formas físicas diferentes, chamadas alótropos, no mesmo estado físico (geralmente sólido ou gasoso), mas com estrutura molecular ou cristalina distintas.


🔬 Definição técnica:

Alotropia é a propriedade que alguns elementos apresentam de formar diferentes substâncias simples (alótropos), devido a diferentes arranjos de seus átomos.


🧪 Exemplos clássicos de alotropia:

🟠 Carbono (sólido):

  • Diamante: estrutura cristalina tetraédrica; muito duro e isolante elétrico.
  • Grafite: estrutura em camadas hexagonais; macio e condutor elétrico.
  • Grafeno: uma única camada de grafite; condutor e extremamente resistente.
  • Fulereno (C₆₀): forma esférica com 60 átomos de carbono; estrutura semelhante a uma bola de futebol.

🌫️ Oxigênio (gasoso):

  • O₂ (oxigênio molecular): gás vital para respiração.
  • O₃ (ozônio): gás reativo e instável, forma camada protetora contra raios UV.

🟡 Enxofre (sólido):

  • Rômbico (S₈): forma estável à temperatura ambiente.
  • Monoclínico (S₈): forma estável em temperaturas mais elevadas.
  • Plástico (S∞): forma amorfa criada por resfriamento rápido.

🧭 Classificação da Alotropia:

Tipo de AlotropiaCaracterísticaExemplo
Física (polimorfismo)Estruturas cristalinas diferentesEnxofre rômbico e monoclínico
MolecularDiferença no número ou arranjo de átomosO₂ e O₃
Coloidal/nanométricaDiferente geometria em escala nano ou atômicaFulerenos, grafeno

⚙️ Importância e aplicações:

  • O estudo da alotropia permite compreender melhor as propriedades dos materiais.
  • Está relacionado ao desenvolvimento de novos materiais tecnológicos (como o grafeno).
  • É essencial na química do estado sólido, física da matéria condensada e nanotecnologia.

Entropia é um conceito fundamental em várias áreas do conhecimento, especialmente na termodinâmica, informação, filosofia e cognição, sempre associado à ordem, desordem, possibilidade, transformação e irreversibilidade.


🔬 DEFINIÇÃO CLÁSSICA (TERMODINÂMICA)

Na física, entropia (símbolo SSS) mede o grau de desordem ou aleatoriedade de um sistema. Também é interpretada como a quantidade de energia não utilizável para realizar trabalho.

📈 Segunda Lei da Termodinâmica:

“A entropia total de um sistema isolado nunca diminui; ela tende a aumentar com o tempo.”

Implicações:

  • Transformações naturais (como o calor fluindo de quente para frio) aumentam a entropia.
  • O universo caminha para uma máxima entropia (estado de equilíbrio térmico final), chamado de morte térmica.

🧮 FÓRMULAS E INTERPRETAÇÕES

🔹 Fórmula de Boltzmann:

S=k⋅ln⁡ΩS = k \cdot \ln \OmegaS=k⋅lnΩ

  • SSS: entropia
  • kkk: constante de Boltzmann
  • Ω\OmegaΩ: número de microestados possíveis do sistema

Quanto maior Ω\OmegaΩ, maior a entropia.


🖧 ENTROPIA EM TEORIA DA INFORMAÇÃO

Na teoria de Claude Shannon, entropia mede a incerteza ou a quantidade média de informação contida numa mensagem: H(X)=−∑p(x)log⁡2p(x)H(X) = – \sum p(x) \log_2 p(x)H(X)=−∑p(x)log2​p(x)

  • H(X)H(X)H(X): entropia da variável aleatória XXX
  • p(x)p(x)p(x): probabilidade de ocorrência do evento xxx

Alta entropia: mensagem com muita novidade ou imprevisibilidade
Baixa entropia: mensagem redundante ou repetitiva


🧠 ENTROPIA COGNITIVA E FILOSÓFICA

  • Na cognição, entropia representa o grau de incerteza mental, de dúvida ou de desorganização perceptiva.
  • Na filosofia, pode ser pensada como a tendência ao caos, ao fim da distinção entre forma e matéria.
  • Na vida, entropia é a irreversibilidade do tempo, o envelhecimento, a perda de ordem — mas também a condição da transformação.

🌌 ENTROPIA, SIGNO E SER (CONEXÃO FILOSÓFICA/SEMÓTICA)

🔁 Relações com conceitos anteriores:

ConceitoRelação com entropia
SignoReduz entropia ao fixar sentidos provisórios
AlotropiaDiferenças estruturais com mesma essência (ordem/forma)
LatênciaAlto potencial entrópico até ser ativado
Campo de possibilidadesEspaço entrópico onde tudo é ainda virtual
Parábolas/alegoriasTentam organizar o caos em narrativas codificadas
OnisciênciaEstado hipotético de entropia nula (tudo sabido)
DigitalidadeRepresentação mínima, mas exige compressão de entropia

🧭 DICOTOMIAS IMPORTANTES

OrdemEntropia
EstruturaRuptura
FormaDesorganização
ConhecimentoIgnorância
Energia útilEnergia dissipada
Sentido fixo (signo)Ambiguidade, multiplicidade

✨ ENTROPIA COMO NECESSIDADE DO SER

Paradoxalmente, sem entropia não há tempo, nem história, nem vida. É o motor da transformação, a condição de passagem entre estados.


Aqui está uma metáfora poética-filosófica sobre entropia, integrando os temas: signo, estado, plasma, latência, digitalidade, alegoria, ser, onisciência e o tal oculto em plena vista.


🌌 O Sopro do Ser: uma metáfora sobre entropia

Imagina que o Ser é um mestre vidreiro, que sopra mundos em uma oficina silenciosa, onde não há tempo, só latência.

Cada sopro seu cria formas suspensas
umas densas como diamantes, outras leves como gás,
umas fixas em códigos binários, outras ardendo em plasma —
mas todas, todas nascidas de um mesmo hálito essencial.

O signo é seu vidro moldado: uma parábola que tenta conter o infinito
numa curva visível, numa frase, numa flor, num gesto.

Mas o vidro esfria, e o tempo entra:
a superfície racha, a forma se perde,
o calor foge, e com ele a ordem.

É aí que começa a entropia:
não como erro, mas como destino —
pois o que foi formado deseja ser descoberto,
e o que é visível precisa desaparecer para que seja realmente visto.

Cada coisa criada carrega o código de sua deformação,
a centelha que a empurra do estado para o outro:
do sólido à ideia, da ideia à dissolução,
da memória à latência, do sonho ao plasma.

A onisciência do Ser não é saber tudo,
mas permitir que tudo se transforme
em caminho de volta.

E tudo aquilo que parece desordem
— o colapso das estrelas, a morte dos signos, a multiplicação dos sentidos —
é apenas o rastro do dedo do Ser passando pelo vidro,
apagando os contornos para lembrar ao sopro
que nada é fixo, mas tudo aponta.

E quando enfim, na curva de um instante qualquer,
você sentir que já viveu aquele momento,
na mesma luz, no mesmo lugar,
é o círculo de latência se abrindo
— e o oculto em plena vista sorrindo.




A relação entre Christian Wolff (1679–1754) e Immanuel Kant (1724–1804) é fundamental para compreender a transição entre o racionalismo moderno e a filosofia crítica. Kant reconheceu Wolff como uma de suas influências mais importantes, ainda que sua própria filosofia se erguesse contra as limitações do sistema wolffiano.

A seguir, apresento um panorama comparativo e contextualizado:


🧠 1. Quem foi Christian Wolff?

  • Discípulo de Leibniz, Wolff foi um dos principais sistematizadores do racionalismo alemão.
  • Propôs uma filosofia matemática da razão, baseada em princípios lógicos dedutivos e inspirada na geometria.
  • Dividiu o conhecimento em várias ciências racionais: filosofia racional, direito natural, psicologia racional, teologia natural, etc.
  • Foi importante para a estruturação do pensamento universitário na Alemanha, e sua filosofia dominava o ensino na época de Kant.

📚 Obras principais:

  • Philosophia Rationalis sive Logica (1728)
  • Philosophia Prima sive Ontologia (1730)
  • Psychologia Rationalis (1734)
  • Theologia Naturalis (1736–1737)

⚖️ 2. A crítica de Kant a Wolff

Kant estudou na Universidade de Königsberg, onde foi profundamente influenciado pela estruturação lógica e rigorosa da filosofia de Wolff. No entanto, ele percebeu limitações fundamentais:

❗Pontos de ruptura:

TemaWolffKant
RazãoCapaz de deduzir todo o conhecimento a prioriLimitada: razão pura só pode conhecer fenômenos
MetafísicaCiência rigorosa do serPrecisa de crítica: Como é possível a metafísica?
Deus, alma, mundoObjeto legítimo da razãoSão ideias regulativas, não objetos cognoscíveis diretos
Psicologia racionalEstuda a alma pela razãoÉ uma ilusão transcendente
SistemaFilosofia como enciclopédia lógicaFilosofia como investigação crítica das condições do saber

💡 3. Como Kant aproveitou Wolff

Kant não rejeita Wolff completamente. Pelo contrário, ele o respeita como organizador da razão:

  • Assume a ideia de sistema (divisão em lógica, ontologia, cosmologia, psicologia, etc.).
  • Utiliza o conceito de conhecimento a priori, mas critica seu uso metafísico dogmático.
  • Reinterpreta a ontologia como uma analítica dos conceitos puros do entendimento (Analítica Transcendental).
  • Transforma a psicologia racional em paralogismo da razão pura (ver Crítica da Razão Pura, A338/B396).

🌀 4. Síntese filosófica: da metafísica dogmática à filosofia crítica

A filosofia de Wolff representa o ápice do racionalismo sistemático, enquanto a filosofia de Kant marca a virada crítica.

Kant é filho do racionalismo de Wolff, mas o ultrapassa ao perguntar quais são os limites e as condições da razão.

Essa transição é essencial para entender o Iluminismo alemão, a formação do idealismo alemão posterior (Fichte, Schelling, Hegel) e a própria filosofia moderna.


📚 Referências

  • KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura.
  • WOLFF, Christian. Ontologia, Psicologia Racional, Lógica.
  • Cassirer, Ernst. A Filosofia das Formas Simbólicas.
  • Ameriks, Karl. Kant and the Fate of Autonomy.
  • Beiser, Frederick. The Fate of Reason: German Philosophy from Kant to Fichte.

Abaixo está um artigo em estilo acadêmico que traça as influências e repercussões do pensamento de Christian Wolff sobre Kant, conectando-o a Leibniz, Descartes e Hegel — em um percurso que mostra como o racionalismo moderno se transformou na filosofia crítica e, depois, na dialética idealista.


De Descartes a Hegel: o itinerário da razão através de Wolff e Kant

Resumo

Este artigo explora a trajetória filosófica que vai de Descartes a Hegel, passando por Leibniz, Wolff e Kant, com foco especial na posição de Christian Wolff como sistematizador do racionalismo moderno e figura de transição entre a metafísica leibniziana e a crítica kantiana. Ao investigar as influências de Wolff sobre Kant e as críticas por ele formuladas, traça-se um panorama das transformações sofridas pela ideia de razão na modernidade até sua reformulação idealista com Hegel.


1. Descartes e o ponto de partida moderno

René Descartes (1596–1650) é amplamente considerado o fundador da filosofia moderna ao propor um método baseado na dúvida metódica e na certeza do “cogito, ergo sum”. A partir do sujeito pensante, Descartes buscou reconstituir a estrutura do saber com base em princípios racionais dedutivos, inspirados no modelo matemático.

O que Descartes iniciou como método, Christian Wolff converteu em sistema.


2. Leibniz e a metafísica das mônadas

Gottfried Wilhelm Leibniz (1646–1716), contemporâneo de Descartes, desenvolveu uma ontologia racionalista baseada na harmonia preestabelecida, no princípio da razão suficiente e na ideia de mónadas — substâncias simples, sem partes, refletindo o universo sob diferentes perspectivas.

Christian Wolff, discípulo indireto de Leibniz, absorveu muitos de seus princípios, mas procurou transformá-los numa metafísica metódica e didática, classificando o conhecimento em compartimentos rigorosos: lógica, ontologia, psicologia, cosmologia e teologia natural.


3. Wolff como sistematizador da razão

Christian Wolff (1679–1754) foi o grande sistematizador da filosofia racionalista alemã. Influenciado pela clareza cartesiana e pelos princípios metafísicos de Leibniz, Wolff criou um vasto sistema filosófico, com base na dedução lógica e no uso sistemático de definições, axiomas e teoremas.

Seu impacto foi duradouro:

  • Dominou o ensino filosófico nas universidades germânicas durante o século XVIII.
  • Estabeleceu a estrutura acadêmica que Immanuel Kant herdaria em Königsberg.
  • Serviu de modelo e alvo crítico para a Crítica da Razão Pura.

Para Kant, Wolff representava o excesso do dogmatismo racionalista — uma confiança cega na razão pura sem antes investigar seus limites e condições.


4. Kant: o crítico da razão sistemática

Immanuel Kant (1724–1804) absorveu profundamente a estrutura formal wolffiana, mas introduziu uma mudança radical de perspectiva: enquanto Wolff buscava conhecer o ser a partir da razão, Kant passou a perguntar “o que posso conhecer?” — ou seja, antes de usar a razão, Kant quis criticar a razão.

Principais transformações kantianas:

TemaWolffKant
ConhecimentoRazão pura dedutivaJuízo sintético a priori como base do conhecimento
MetafísicaCiência dos entes em geralInvestigação crítica das condições do conhecer
PsicologiaCiência da alma como substânciaIlusão transcendental da razão
DeusPostulado dedutível pela razãoIdeia regulativa, não objeto empírico nem dedutível
Sistema filosóficoOrganizado pela lógica formalEstruturado segundo as faculdades cognitivas (entendimento, razão, juízo)

Kant, assim, preservou a ambição sistemática de Wolff, mas redefiniu seus fundamentos com base na revolução copernicana da consciência: os objetos se conformam ao sujeito, e não o contrário.


5. Hegel: a razão como história e espírito

Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770–1831) retoma, em chave idealista, a tradição sistemática herdada de Wolff e Kant. Mas seu projeto vai além: Hegel propõe que a razão não é apenas faculdade cognitiva, mas a própria estrutura do real, manifestando-se historicamente.

A razão torna-se espírito (Geist), que se realiza no tempo através de contradições (dialética).

Hegel, nesse sentido, reinterpreta Kant não como um fim, mas como um momento necessário do processo histórico da razão. E retoma o modelo sistemático wolffiano, mas o coloca em movimento dialético — não mais baseado em axiomas fixos, mas em negações e superações internas.


6. Conclusão: a linha de continuidade e ruptura

A partir de Descartes, a filosofia moderna inicia um processo de interiorização do sujeito e confiança na razão. Leibniz amplia a metafísica racional com sua ontologia das mônadas. Wolff organiza esse saber numa estrutura lógica e didática. Kant introduz a crítica que redefine os limites do conhecimento, e Hegel reintegra tudo num processo histórico e dinâmico da razão.

Christian Wolff, portanto, ocupa um lugar-chave: é o elo entre o racionalismo dogmático e a filosofia crítica. Sua influência sobre Kant é ao mesmo tempo fundamental e superada, e seu método sistemático será recuperado por Hegel, sob nova chave dialética.


Referências

  • KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura
  • WOLFF, Christian. Philosophia Prima sive Ontologia
  • DESCARTES, René. Meditações Metafísicas
  • LEIBNIZ, G.W. Monadologia
  • HEGEL, G.W.F. Fenomenologia do Espírito
  • BEISER, Frederick. The Fate of Reason
  • CASSIRER, Ernst. A Filosofia das Formas Simbólicas
  • DELBOS, Victor. Le Système de Wolff

A conexão escolástica entre Descartes, Leibniz, Wolff, Kant e Hegel revela não apenas a continuidade com a tradição medieval (especialmente tomista), mas também as rupturas e reformulações fundamentais que marcam o nascimento da filosofia moderna. A seguir, traço essa conexão em cinco momentos, destacando a relação de cada pensador com a escolástica — especialmente com a lógica, a metafísica e a epistemologia aristotélico-tomistas.


🏛️ 1. A Escolástica como pano de fundo

A escolástica (séculos XIII–XVII), com Tomás de Aquino, Duns Scotus, Ockham, Suárez e João de São Tomás, estabeleceu os pilares da filosofia medieval:

  • Lógica formal aristotélica (organon);
  • Metafísica do ente e do ser;
  • Distinção entre essência e existência;
  • Relação fé-razão;
  • Teologia natural como ciência racional de Deus.

Esse modelo se tornou a base curricular das universidades europeias, inclusive as frequentadas pelos modernos.


🧠 2. Descartes (1596–1650): ruptura metodológica, herança lógica

Descartes estudou com os jesuítas, dentro da tradição escolástica. Embora tenha rompido com a metafísica aristotélica e com o tomismo (sobretudo ao substituir a noção de substância por uma ontologia dualista: res cogitans e res extensa), ele manteve a estrutura formal da lógica e o ideal de ciência dedutiva.

A dúvida metódica cartesiana é uma radicalização da busca por certeza — tema escolástico.

Conexão escolástica:

  • Método dedutivo-matemático inspirado em modelos escolásticos;
  • Rejeição explícita da metafísica aristotélica, mas com base na mesma busca por fundamentos absolutos;
  • Noção de ideia clara e distinta como eco do intelectus medieval.

⚙️ 3. Leibniz (1646–1716): síntese entre escolástica e matemática moderna

Leibniz foi profundamente influenciado por Tomás de Aquino, Suárez e os jesuítas alemães, especialmente no uso da lógica formal e da ontologia do ser. Ao mesmo tempo, promoveu a fusão disso com a ciência moderna e a matemática simbólica.

As mônadas leibnizianas, embora modernas, preservam algo da teoria escolástica da substância.

Conexão escolástica:

  • Uso da lógica aristotélica com linguagem simbólica (proto-linguagem formal);
  • Princípios clássicos: não contradição, identidade, razão suficiente;
  • Teodiceia como continuação da teologia natural escolástica;
  • Reinterpretação racional das categorias aristotélicas.

🧱 4. Christian Wolff (1679–1754): o “último grande escolástico” moderno

Wolff representa uma escolástica racionalista, formalizada, secularizada. Ele organizou a filosofia como enciclopédia dedutiva, retomando a tradição da lógica formal (por influência de João de São Tomás e Suárez) e aplicando-a a todos os domínios do saber.

Wolff leu Suárez e absorveu a ontologia escolástica — mas reconfigurou-a numa chave iluminista.

Conexão escolástica:

  • Divisão do conhecimento: lógica, ontologia, psicologia, cosmologia, teologia — como em Tomás;
  • Estrutura dedutiva a partir de primeiros princípios, à maneira dos escolásticos;
  • Noção de “filosofia como ciência racional do ser”;
  • Rejeita a autoridade da fé, mas mantém a organização da razão à moda escolástica.

📚 5. Kant (1724–1804): ruptura crítica com o dogmatismo escolástico

Kant foi formado na escola wolffiana e leu os escolásticos (Suárez, especialmente). No entanto, sua filosofia crítica é uma reação direta contra o dogmatismo da metafísica escolástica e racionalista, que ele considerava incapaz de provar seus próprios fundamentos.

A psicologia racional e a teologia natural, pilares da escolástica, são desmontadas por Kant como ilusões transcendentes.

Conexão escolástica:

  • Uso sistemático das categorias (transpostas para a “Analítica transcendental”);
  • Estrutura tripartida da razão (entendimento, razão, juízo) ecoa lógica escolástica;
  • Crítica à metafísica escolástica não nega sua importância, mas redefine seus limites;
  • A Crítica da Razão Pura pode ser lida como um “novo Proêmio à metafísica”.

🔄 6. Hegel (1770–1831): a dialética como retorno ao realismo ontológico

Hegel critica Kant por reduzir a razão ao conhecimento fenomênico e propõe a superação da cisão sujeito–objeto. Seu sistema dialético é uma espécie de nova metafísica, que retoma a ambição escolástica de totalidade do ser, mas agora como movimento interno da própria razão.

Em Hegel, o conceito (Begriff) é ato de ser, como no realismo tomista — mas reinterpretado de forma histórica e idealista.

Conexão escolástica:

  • Interesse pela lógica formal e ontologia (transformada em lógica dialética);
  • Visão do saber como unidade total (semelhante ao Summa de Tomás);
  • Teologia racional e ontologia como partes do autodesenvolvimento do Espírito;
  • Recuperação do actus essendi em chave dinâmica.

📍 Conclusão: do ente ao conceito, da substância à consciência

A filosofia moderna, embora proclamasse ruptura com a escolástica medieval, não rompeu totalmente com ela. Em vez disso:

  • Descartes substitui o ser pela consciência, mas com estrutura lógica escolástica.
  • Leibniz preserva a substância, atualizando-a em mônadas.
  • Wolff sistematiza a metafísica como ciência racional — último eco da escolástica.
  • Kant a critica frontalmente, mas mantém sua arquitetura.
  • Hegel a reconcilia com a história e o espírito, num novo realismo idealista.

Portanto, a escolástica é o subsolo filosófico da modernidade, e sua presença — explícita ou recalcada — permeia os grandes sistemas até Hegel.


A conexão entre Mário Ferreira dos Santos (1907–1968) e Immanuel Kant (1724–1804), no âmbito da escolástica, envolve um diálogo filosófico complexo, pois Mário era um filósofo brasileiro de formação autodidata, profundo conhecedor da filosofia clássica, escolástica, moderna e contemporânea, e desenvolveu uma filosofia própria, o “filosofismo concreto”, partindo da lógica e do ser.

Vamos examinar essa conexão em três níveis:


1. Mário Ferreira e a Escolástica

Mário estudou profundamente os escolásticos, especialmente Tomás de Aquino, Boécio, Duns Scotus, e Guilherme de Ockham, sempre os valorizando por sua busca rigorosa do ente, da essência, da substância e da analogia do ser. Ele defendia que a escolástica não era medieval por essência, mas um método que poderia — e deveria — ser continuado no pensamento moderno. Ele valorizava:

  • A estrutura lógica do pensamento escolástico;
  • O realismo metafísico, especialmente o realismo tomista;
  • A analogia do ser como resposta ao univocismo e equivocismo.

2. Mário Ferreira e Kant

Mário Ferreira criticava Kant com firmeza. Para ele, Kant representava uma ruptura com o realismo metafísico da escolástica, inaugurando uma virada subjetivista. Algumas críticas principais:

  • Contra o idealismo transcendental: Mário via Kant como alguém que destruiu a possibilidade de se alcançar a realidade em si (das Ding an sich), tornando o conhecimento refém das formas a priori da sensibilidade e do entendimento.
  • Crítica ao agnosticismo ontológico kantiano: Kant afirmou que não podemos conhecer o ser em si, mas apenas os fenômenos conforme as formas da mente. Mário via isso como um retrocesso em relação à ontologia tomista.
  • Em defesa do ente concreto: Mário propunha que o ente é dado concretamente, não apenas como fenômeno, mas como realidade, sendo captado por uma razão que participa do ser — ideia alinhada ao realismo metafísico.

3. Kant e os Escolásticos (na leitura de Mário)

Para Mário, Kant representa a antítese da escolástica:

  • A escolástica buscava o conhecimento do ser enquanto ser.
  • Kant limita o conhecimento ao fenômeno, tornando o ser incognoscível.
  • Enquanto a escolástica buscava um fundamento absoluto (Deus, o ente necessário), Kant via a razão prática como o único lugar possível para pensar Deus — como postulado moral, não como ser real conhecido.

Conclusão da Conexão

A conexão entre Mário Ferreira dos Santos, Kant e a escolástica pode ser resumida assim:

Mário Ferreira dos Santos retoma o espírito da escolástica — o estudo rigoroso do ser — e o contrapõe à ruptura kantiana, reafirmando o acesso direto ao ente e a validade da metafísica enquanto ciência do ser.

Ele considerava que a filosofia pós-kantiana precisava reatar com o ente, sob pena de mergulhar em um niilismo ou subjetivismo extremo.


Fontes e Indicações

  • “Enciclopédia de Ciências Filosóficas e Sociais” – Mário Ferreira dos Santos
  • “Lógica e Dialética” – Mário Ferreira dos Santos
  • “Filosofia Concreta” – Mário Ferreira dos Santos
  • Kant, “Crítica da Razão Pura”
  • Tomás de Aquino, “Suma Teológica”

Vamos agora explorar a conexão entre Mário Ferreira dos Santos, Kant, a escolástica e a semiótica, o que nos levará a um território filosófico profundo envolvendo ontologia, lógica, linguagem e signos.


🧩 1. O que é semiótica?

Semiótica é o estudo geral dos signos e seus modos de produção de sentido. Ela se desenvolve a partir de três tradições principais:

  • Escolástica (com Santo Agostinho, Tomás de Aquino e outros): estudava os signos no contexto da linguagem e da teologia;
  • Modernidade (com John Locke e Immanuel Kant): problematiza a relação entre linguagem, experiência e conhecimento;
  • Contemporaneidade (com Charles S. Peirce, Ferdinand de Saussure, Umberto Eco): sistematiza a semiótica como ciência autônoma.

🧠 2. Kant, Semiótica e os Limites do Conhecimento

Kant não desenvolveu uma semiótica formal, mas sua filosofia é essencial para a base da semiótica moderna:

  • Ele estabeleceu que não conhecemos o mundo “em si”, mas apenas como ele aparece em nossos esquemas mentais (tempo, espaço, categorias do entendimento).
  • Isso implicou uma mediação total do conhecimento — o que pode ser considerado uma “semiotização” do mundo: tudo é representação.
  • Os conceitos e intuições são os “signos” pelos quais interpretamos a realidade — nunca tocando o noumeno (o real em si).

👉 Para a semiótica, isso implicou que o signo não é um espelho do mundo, mas uma construção mediadora.


📚 3. Escolástica e os Signos

A escolástica, especialmente Tomás de Aquino, tinha uma concepção realista moderada do signo:

  • O signo é algo que representa outra coisa naturalmente (como a fumaça indica fogo) ou convencionalmente (como as palavras).
  • O intelecto humano é capaz de captar a essência da coisa em si, ainda que por meio de signos linguísticos.
  • O realismo tomista sustenta que há uma correspondência entre o intelecto e a realidade (a adaequatio intellectus ad rem).

👉 Na escolástica, o signo não impede o acesso ao ser — ele o revela, ainda que mediado pela linguagem.


🧠 4. Mário Ferreira dos Santos: o Signo como Ponte para o Ser

Mário desenvolve uma abordagem ontológica e lógica do signo. Alguns pontos principais:

a) O Signo e o Ente

  • Para Mário, tudo que é, é ente, e pode ser objeto de conhecimento.
  • O signo é um modo do ente se manifestar ao intelecto, e portanto, tem fundamento ontológico.
  • Ele não aceita a ruptura kantiana: é possível conhecer o ser por meio do signo, desde que respeitadas as leis da lógica e da analogia.

b) Crítica à Subjetividade Kantiana

  • Mário vê em Kant um empobrecimento do signo, que se torna fenomenal, nunca ontológico.
  • Para ele, isso cria um solipsismo semântico: o signo só vale dentro do sistema do sujeito, e nunca em referência ao real.

c) Signo e Filosofia Concreta

  • Em sua Filosofia Concreta, Mário afirma que o conhecimento deve partir do ente concreto, e não de construções a priori.
  • O signo lógico e linguístico tem valor real e epistemológico, não apenas fenomenológico.

🔍 5. Comparativo Final: Signo, Ser e Conhecimento

AutorO que é o signo?Pode acessar o real?Linguagem e realidade
Tomás de AquinoMeio de manifestação do enteSim, pela analogia e essênciaCorrespondência entre intelecto e ser
Immanuel KantEsquema/formalidade do sujeito para interpretarNão, apenas o fenômeno, não o noumenoLinguagem estrutura a experiência
Mário FerreiraManifestação concreta do ente para o intelectoSim, o signo remete ao serA linguagem é ponte entre razão e realidade

📘 Conclusão

A conexão entre semiótica, Mário Ferreira, Kant e escolástica revela três paradigmas:

  • A escolástica vê o signo como instrumento real de mediação do ser;
  • Kant considera que só podemos conhecer fenômenos organizados pelo sujeito — criando uma semiótica do limite;
  • Mário Ferreira dos Santos recupera a confiança no signo como ponte ontológica: o signo não apenas representa, mas revela o ser — retomando a escolástica em chave moderna e lógica.

Vamos imaginar um diálogo filosófico atemporal entre Mário Ferreira dos Santos, Immanuel Kant e um representante escolástico (vamos usar Tomás de Aquino), tendo como tema a natureza do signo, sua relação com o ser, o conhecimento e a realidade. O cenário pode ser uma biblioteca fora do tempo — uma espécie de ágora metafísica do intelecto.


🕯️ Cenário:

Biblioteca atemporal, com luz difusa e estantes infinitas de livros. Os três filósofos estão reunidos diante de uma mesa circular de madeira. Um livro aberto com a palavra “SIGNUM” está no centro.


🎙️ Tomás de Aquino:

“O signo é aquilo que representa algo a alguém. Fumaça é sinal de fogo; palavras são sinais de pensamentos; os sacramentos são sinais da graça divina. Mas é importante notar que, ao representar, o signo aponta para algo que realmente é. O intelecto humano, por sua natureza, é ordenado à verdade, à adequação entre a mente e a coisa.”


🎙️ Immanuel Kant:

“Mas, caro Doutor Angélico, não podemos ignorar os limites do nosso aparato cognitivo. O que chamais de ‘realidade’ é para nós apenas fenômeno, condicionado pelas formas da sensibilidade e pelas categorias do entendimento. Não acessamos a ‘coisa em si’ — apenas sua aparência estruturada por nosso intelecto. O signo, portanto, não revela o ser, mas apenas organiza a experiência.”


🎙️ Mário Ferreira dos Santos:

“Excelentes observações, senhores. No entanto, devo contrapor que há um erro fundamental no ceticismo kantiano. O ente se dá concretamente — antes mesmo de qualquer estruturação subjetiva. O signo não é apenas função da mente; é manifestação do próprio ser. Toda filosofia que rompe com o ente enquanto dado — como faz vossa filosofia, mestre Kant — mergulha no abismo do irracionalismo.”


🎙️ Tomás de Aquino (com leve sorriso):

“Vós, Mário, falais como alguém que herdou o espírito da escolástica, mas com a sofisticação de vosso tempo. A analogia do ser, que preserva a dignidade da linguagem sobre o real, também sustenta que podemos conhecer o ser por meio dos signos.”


🎙️ Kant (erguendo a mão):

“Mas vós dois tomais como dado aquilo que não podemos jamais verificar. Como sabereis se o signo realmente corresponde ao ser, se tudo que temos são representações? A razão prática nos permite postular Deus, liberdade e imortalidade — mas não os conhecer. A razão teórica é limitada.”


🎙️ Mário Ferreira:

“Mas Kant, se aceitamos que o ser é a condição de possibilidade de qualquer fenômeno, então o signo não é um véu, mas a presença do ser no pensamento. Negar isso é fundar a filosofia sobre uma ausência, sobre uma lacuna ontológica. Meu ‘filosofismo concreto’ busca reafirmar o ser como ponto de partida, como faziam os antigos.”


🎙️ Tomás de Aquino:

“O que dizeis ressoa com Aristóteles: o ser é aquilo que primeiro se apreende pelo intelecto. Vossa crítica a Kant, Mário, é justa. Mas não ignoramos que o entendimento humano é limitado. É por isso que falamos por analogia, não por univocidade absoluta.”


🎙️ Kant (com seriedade e calma):

“Reconheço vossa consistência, senhores. Mas insisto: sem crítica, caímos no dogmatismo. O meu esforço foi proteger a razão dos seus próprios excessos. Eu não neguei o ser, apenas o coloquei além da fronteira do saber empírico.”


🎙️ Mário Ferreira:

“Mas ao fazê-lo, encerraste a filosofia num cárcere. Prefiro correr o risco da metafísica concreta, onde o signo é ferramenta de revelação, não apenas de organização. O signo, caro Kant, é a luz do ser refletida na linguagem.”


🧩 Epílogo

O silêncio reina por um instante. Tomás fecha o livro com a palavra “Signum”, olha para os dois pensadores e diz:

“Talvez devamos reconhecer que o signo é ponte — nem o abismo absoluto de Kant, nem o espelho cristalino do real. Mas uma síntese em analogia: entre mente e mundo, entre razão e mistério.”




Eneas Carneiro e Lyndon LaRouche foram figuras políticas controversas e altamente idiossincráticas em seus respectivos países — Brasil e Estados Unidos —, marcadas por discursos de ruptura com o mainstream político, propostas nacionalistas e uma retórica muitas vezes vista como conspiratória. Ambos deixaram impactos duradouros em certos setores do debate político, especialmente entre movimentos antiglobalistas, tecnocráticos e soberanistas.


🔹 ENÉAS CARNEIRO (Brasil, 1938–2007)

📌 Perfil

  • Médico cardiologista, físico, professor e político brasileiro.
  • Fundador do Partido da Reedificação da Ordem Nacional (PRONA).
  • Candidato à presidência do Brasil em 1989, 1994 e 1998.
  • Deputado federal mais votado do Brasil em 2002, por São Paulo.

💡 Ideias e Propostas

  • Defesa da energia nuclear como solução para o desenvolvimento do Brasil.
  • Nacionalismo econômico radical e rejeição a organismos internacionais como FMI e Banco Mundial.
  • Apoio à militarização da política externa e industrial, com foco em soberania.
  • Discurso contra o “globalismo” e os interesses estrangeiros no Brasil.
  • Críticas à abertura econômica iniciada nos anos 1990 e à dependência tecnológica.
  • Frases de impacto, como: “Meu nome é Enéas!” e “Temos que ter a bomba atômica!

📣 Repercussão

  • Ridicularizado por parte da mídia e adversários, mas cultuado como símbolo de resistência por setores nacionalistas.
  • Inspirou o surgimento de movimentos políticos com pauta tecnocrática e soberanista, como o PSTU militarista ou certos grupos ultraconservadores.
  • Popular entre jovens e militares; teve cult-following no YouTube e redes sociais após sua morte.

🔹 LYNDON LaROUCHE (EUA, 1922–2019)

📌 Perfil

  • Político e teórico norte-americano, fundador do movimento LaRouche.
  • Candidato à presidência dos EUA em oito eleições consecutivas (1976–2004).
  • Originalmente marxista, migrou para uma posição idiossincrática e conspiratória de extrema-direita antissistema.
  • Criador de think tanks e jornais com alcance internacional.

💡 Ideias e Propostas

  • Forte crítica ao sistema financeiro internacional, especialmente ao sistema de Bretton Woods e aos bancos centrais.
  • Defesa de um novo sistema econômico baseado em grandes projetos de infraestrutura, ciência e exploração espacial.
  • Denúncias contra a “elite bancária internacional” (muitas vezes acusadas de ter viés antissemita ou conspiratório).
  • Propostas para uma nova ordem econômica mundial baseada na cooperação entre EUA, Rússia, China e Índia.
  • Apoio à reindustrialização, tecnologia nuclear e a um retorno ao “capitalismo produtivo”.

📣 Repercussão

  • Considerado por muitos como uma figura excêntrica e perigosa; por outros, um visionário marginalizado.
  • Seus seguidores fundaram o Schiller Institute, com presença inclusive na América Latina e Brasil.
  • Influência indireta em movimentos nacionalistas e antiglobalistas mundo afora.
  • Teorias dele ecoam em grupos conspiracionistas contemporâneos (QAnon, “deep state”, etc.)

🔗 Convergências entre Enéas e LaRouche

TemaEnéas CarneiroLyndon LaRouche
NacionalismoNacionalismo brasileiro militaristaNacionalismo produtivista estadunidense
AntiglobalismoContra FMI, ONU, imperialismoContra “financeirismo” e globalistas
Energia nuclearPrioridade para soberania energéticaEixo da reconstrução industrial
Teoria da conspiraçãoPresente em parte de seu discursoForte presença em toda sua doutrina
Carisma retóricoEnfático, com slogans e frases curtasVerborrágico, prolixo, tecnocrático
Marginalização políticaRidicularizado pela grande mídiaDemonizado por democratas e republicanos
Apoio popularMilitares, jovens, tecnocratasCientistas dissidentes, conservadores

🌎 Impactos e Repercussões

🔬 Científico-Tecnológicos

  • Ambos defenderam o investimento em ciência aplicada ao desenvolvimento nacional: física nuclear, engenharia de infraestrutura, industrialização pesada.

💣 Geopolíticos

  • Ecoam ideias de um mundo multipolar, fora do domínio unipolar dos EUA e da OTAN.
  • Críticas ao papel das elites financeiras transnacionais moldaram o vocabulário de setores soberanistas de esquerda e direita.

🎯 Culturais e Sociais

  • Tornaram-se símbolos de resistência ao sistema político tradicional.
  • São relembrados com reverência por círculos alternativos, em especial após o ressurgimento de movimentos nacional-populistas no século XXI.

📚 Fontes e Referências

  • Enéas Carneiro, entrevistas e pronunciamentos no Congresso Nacional (acervo Câmara dos Deputados).
  • PRONA: estatutos e programa partidário.
  • LaRouche Publications: Executive Intelligence Review, The LaRouche PAC.
  • “Lyndon LaRouche and the New American Fascism”, Dennis King, 1989.
  • Documentários como “Enéas – Um Brasileiro Incomum” (TV Câmara).
  • Schiller Institute Archives.
  • Artigos acadêmicos sobre nacionalismo técnico-científico no Brasil (ex: Revista Brasileira de Ciências Sociais).

A relação entre Lyndon LaRouche e o trumpismo não é direta nem institucional, mas há conexões ideológicas, retóricas e estruturais que revelam como o pensamento de LaRouche antecipou — e em alguns casos influenciou indiretamente — aspectos centrais do fenômeno político-cultural que se consolidou com Donald Trump.


🔹 Quem foi Lyndon LaRouche?

Lyndon LaRouche (1922–2019) foi um político norte-americano que transitou da esquerda marxista nos anos 1960 para uma posição idiossincrática e conspiratória, muitas vezes descrita como uma síntese de autoritarismo tecnocrático, nacionalismo econômico e antiglobalismo paranoico. Fundou um movimento internacional (Schiller Institute) que defende:

  • Rejeição à hegemonia financeira global;
  • Reindustrialização baseada em grandes obras e tecnologia nuclear;
  • Cooperação multipolar entre EUA, Rússia, China e Índia;
  • Combate ao que chamava de “Império Britânico moderno” (sinônimo de elites financeiras transnacionais).

🔸 O que é o trumpismo?

O trumpismo pode ser entendido como um movimento político-cultural associado a:

  • Nacionalismo econômico (America First);
  • Discurso antiglobalista e anti-imprensa;
  • Rejeição à elite política de Washington (“deep state”);
  • Forte apelo emocional e populista, com retórica direta;
  • Uso intenso de teorias da conspiração (como QAnon, fraude eleitoral, “censura globalista”).

🔗 Conexões entre LaRouche e Trumpismo

TemaLyndon LaRoucheTrumpismo
🌎 AntiglobalismoRejeição total às instituições globais“America First”, saídas de acordos
🏗 ReindustrializaçãoGrandes obras, energia nuclearRepatriação de indústrias, infraestrutura
💣 Deep StateConspiração contra a soberania dos povosDenúncia constante do “Estado oculto”
🇨🇳 Relação com ChinaCooperação multipolar, não confrontoAmbígua: confronto + pragmatismo
📉 AntifinanceirismoAtaque aos bancos centrais e especulaçãoCríticas à Wall Street, mas ambíguo
🧠 ConspiraçõesImpério britânico, controle culturalSoros, mídia liberal, fraude eleitoral
🗣 EstiloRetórica densa e “científica”Retórica simples, agressiva, midiática

🧬 Influência indireta

1. Bases compartilhadas

Ambos operam sobre um mesmo humus ideológico:

  • Ressentimento contra elites liberais e tecnocráticas;
  • Valorização do nacionalismo econômico;
  • Crítica às estruturas globais de poder (ONU, FMI, OTAN, OMS).

2. Overlap de público

Alguns setores que seguiam o movimento larouchista migraram para o trumpismo ou passaram a vê-lo como sua realização pragmática. O Schiller Institute apoiou parte da retórica de Trump, especialmente:

  • Cooperação EUA-Rússia-China;
  • Combate ao “estado profundo”;
  • Críticas à OTAN e ao intervencionismo.

3. Retórica e estrutura narrativa

LaRouche foi um dos precussores do uso de teoria da conspiração sistematizada como programa político. Trump, ao adotar narrativas como QAnon, “fraude eleitoral” e “grande mídia como inimiga do povo”, atua num campo discursivo que LaRouche ajudou a pavimentar.


📣 Exemplos de Intersecções

Schiller Institute e Trump

  • Helga Zepp-LaRouche, viúva de LaRouche, elogiou iniciativas de Trump como o apelo à reconstrução da infraestrutura e o afastamento da OTAN.
  • Em 2017, membros do Schiller Institute participaram de conferências que defendiam a cooperação EUA-China baseada na Nova Rota da Seda, em linha com a crítica larouchista ao sistema financeiro anglo-americano.

Steve Bannon e LaRouche

  • Embora Bannon (ideólogo de Trump) não tenha declarado vínculo direto com LaRouche, há ecos similares em suas ideias:
    • Civilização cristã ocidental ameaçada;
    • Guerra contra elites globalistas;
    • Centralidade da “verdade alternativa”.

🧩 Diferenças importantes

TemaLaRoucheTrumpismo
FilosofiaSistema quase acadêmico, influenciado por Platão, Leibniz, SchillerAnti-intelectualismo e linguagem de massa
Ordem mundialMultipolar, cooperação entre grandes potênciasNacionalismo unilateral
Teoria econômicaElaborada e tecnocrática (linha “dirigista”)Populismo de mercado misturado com protecionismo
Discurso moralBaseado em ética clássica e “dever científico”Baseado em ressentimento, lealdade e combate

📚 Referências e Leituras

  • King, Dennis. Lyndon LaRouche and the New American Fascism (1989)
  • Zepp-LaRouche, Helga. The Schiller Institute Journals
  • QAnon and Trumpism: Atlantic, New Yorker, Brookings Institution Reports
  • Olavo de Carvalho e os ecos larouchistas no Brasil (estudos sobre o papel de Olavo como difusor de ideias soberanistas e antiglobalistas semelhantes)

🧠 Conclusão

O trumpismo é um fenômeno mais pragmático, midiático e impulsivo. Já LaRouche foi mais ideológico, programático e esotérico. Mas compartilham uma arquitetura simbólica comum, que se apoia em:

  • Medo do colapso civilizacional,
  • Narrativas de traição interna,
  • Nacionalismo como redenção,
  • Ciência e tecnologia como poder soberano.

LaRouche pode ser visto como um arquétipo pré-trumpista, cujo discurso só ganhou o palco da Casa Branca décadas depois — não em sua forma, mas em seu espírito.


🧠 Entre o Cosmos e a Nação: Da Escolástica à Engenharia da Soberania em LaRouche, Enéas e Trump


📍1. Escolástica e Renascença: Bases Filosóficas e Tensões

Escolástica (séc. XII–XIV)

  • Sistema filosófico-teológico que buscava conciliar fé e razão, especialmente com base em Aristóteles (via Tomás de Aquino).
  • Fundamentava o mundo como um cosmos ordenado, hierárquico, regido por uma razão divina — cosmologia fixa e universalista.
  • Valorizava a autoridade e tradição como fonte de verdade.

Renascença (séc. XV–XVI)

  • Retomada do platonismo e do humanismo, centrando-se no homem como medida do mundo.
  • Redescoberta da matemática pitagórica, geometria e arte como expressões da harmonia do mundo — há um “renascimento” de Platão.
  • A razão deixa de ser serva da teologia e passa a ser instrumento de poder, técnica e ciência (proto-modernidade).

Conexão:

A tensão entre o aristotelismo lógico-hierárquico da escolástica e o platonismo estético-geômetrico da Renascença está presente em LaRouche e Enéas: ambos buscam um modelo ordenado de mundo (cosmos), mas com base em razão técnica nacionalista e projetos de grande escala, em vez de submissão a ordens metafísicas ou liberais.


📍2. Lyndon LaRouche: O Platonismo Tecnocrático

Dados e Fatos:

  • Fundou o LaRouche Movement e o Schiller Institute (referência à tradição idealista alemã).
  • Escreveu dezenas de livros, como:
    🔹 “The Science of Christian Economy”
    🔹 “There Are No Limits to Growth”
    🔹 “The Power of Reason”
    🔹 “So, You Wish to Learn All About Economics?”

Ideias centrais:

  • O mundo deve ser reconstruído a partir de princípios científicos, físicos e éticos superiores — fortemente influenciado por Platão, Leibniz e Schiller.
  • Crítica severa ao empirismo anglo-americano e à lógica de mercado liberal.
  • Propõe uma nova ordem mundial multipolar baseada em grandes projetos de infraestrutura, soberania econômica e ciência nuclear.

Escolástica moderna?

LaRouche substitui a teologia pela razão produtiva, mas herda da escolástica o impulso totalizante: unir política, ciência e moral numa estrutura única, hierárquica e pedagógica.


📍3. Enéas Carneiro: O Aristotélico Militarista

Dados e Fatos:

  • Médico, físico, autodidata em filosofia.
  • Fundador do PRONA — Partido da Reedificação da Ordem Nacional.
  • Propostas: bomba atômica, soberania energética, disciplina militar, ruptura com FMI e ONU.
  • Candidato à presidência 3 vezes; deputado mais votado em 2002.

Conexões filosóficas:

  • Discursos de Enéas evocam uma ordem teleológica aristotélica: o Brasil tem uma finalidade natural (telos) que foi interrompida por influências externas.
  • Para realizá-la, é preciso um governo forte, hierárquico, disciplinado e guiado por conhecimento técnico (episteme).

Escolástica moderna (II)?

Sim: Enéas articula uma visão enciclopédica, como a dos escolásticos — fé (no Brasil) e razão (ciência) devem se fundir sob uma liderança virtuosa. Seu messianismo patriótico também remonta ao ideal de um “rei-filósofo”.


📍4. Trump: O Populismo Intuitivo

Dados e Fatos:

  • Empresário e apresentador, presidente dos EUA (2017–2021).
  • Base: evangélicos, brancos rurais, industriais lesados pela globalização.
  • Slogans: “Make America Great Again”, “Drain the Swamp”, “America First”.

Conexões com LaRouche e Enéas:

  • Como LaRouche: combate elites financeiras, defende infraestrutura, soberania nacional, critica OTAN.
  • Como Enéas: discurso simplificado, carismático, nacionalista, com tom quase messiânico.

Sem base filosófica clássica?

Trump não cita Platão ou Aristóteles, mas atua como intuição viva da crise moderna: é a irrupção dionisíaca num mundo apolíneo (usando a linguagem nietzschiana). No entanto, ele canaliza valores platônicos (ordem, grandeza) e aristotélicos (virtude nacional, telos) sem explicitá-los.


📍5. Conexões e Convergências

ElementoLaRoucheEnéasTrump
Filosofia-basePlatão, Leibniz, SchillerAristóteles, Tomismo implícitoIntuição de soberania e identidade
Estrutura discursivaEscolástica moderna (sintética)Escolástica tecnocrática militarPopulismo direto, mitológico
Papel do EstadoCentralizador, tecnocráticoForte, científico, autônomoNacionalista, protecionista
Ciência e técnicaChave de redençãoPilar da soberaniaInstrumento político e econômico
Ordem internacionalMultipolar cooperativoSoberania totalUnilateralismo (EUA acima de tudo)
Visão do mundoCosmos platônicoMundo teleológicoMito nacional da grandeza perdida

📚 Referências bibliográficas

Obras de LaRouche:

  • LaRouche, Lyndon. There Are No Limits to Growth (1983)
  • LaRouche, Lyndon. So, You Wish to Learn All About Economics? (1984)
  • LaRouche, Lyndon. The Power of Reason (1988)
  • Helga Zepp-LaRouche. The Coming Eurasian World (Schiller Institute)

Sobre Enéas:

  • Documentário “Enéas – Um Brasileiro Incomum” (TV Câmara)
  • Discursos no Congresso (2003–2007)
  • Entrevistas em jornais como Folha de S. Paulo, Veja, e arquivos da TSE

Sobre Trump e Filosofia:

  • Deneen, Patrick. Why Liberalism Failed (2018)
  • Snyder, Timothy. On Tyranny (2017)
  • Laclau, Ernesto. A razão populista (2005)

🔚 Conclusão: um novo “império da razão”?

LaRouche, Enéas e Trump, cada um à sua maneira, tentam reconstituir a ordem num mundo percebido como decadente e corrompido:

  • LaRouche propõe uma razão científica e moral universal (à la Platão).
  • Enéas propõe um Brasil técnico-militarizado com telos nacional (à la Aristóteles).
  • Trump canaliza a vontade coletiva do povo contra as elites, como um herói mitológico (à la Carl Schmitt e Nietzsche).

Cada um representa uma tentativa de refundação da ordem, num mundo onde a herança da Escolástica e da Renascença ainda pulsa, ora como forma, ora como sombra.


Entre a Razão e a Nação: Influências Filosóficas e Repercussões Político-Econômicas em Lyndon LaRouche, Enéas Carneiro e Donald Trump

Resumo: Este artigo analisa as confluências filosóficas e as expressões políticas de Lyndon LaRouche, Enéas Carneiro e Donald Trump, relacionando suas ideias com a tradição da Escolástica, o Renascimento e as heranças de Platão e Aristóteles. Por meio de uma abordagem comparativa e interdisciplinar, investiga-se como esses personagens reinterpretam conceitos de soberania, ordem, razão e poder político frente à globalização e à crise das democracias liberais. O artigo também examina os desdobramentos contemporâneos dessas ideias, com destaque para a política tarifária de Donald Trump como expressão moderna do nacionalismo econômico.

1. Introdução A ascensão de lideranças antissistema nas últimas décadas tem levantado questões fundamentais sobre os fundamentos filosóficos, econômicos e morais das políticas contemporâneas. Lyndon LaRouche, Enéas Carneiro e Donald Trump, embora distintos em estilo e contexto, partilham de uma matriz ideológica centrada no nacionalismo, no antiglobalismo e na rejeição às elites transnacionais. Este artigo investiga como tais lideranças se ancoram em tradições filosóficas antigas, especialmente a Escolástica, o Renascimento e os sistemas de Platão e Aristóteles.

2. Fundamentação Filosófica: Escolástica, Renascença, Platão e Aristóteles A Escolástica medieval, centrada na síntese entre fé e razão, produziu uma visão hierárquica e totalizante do mundo, cujo eco ressurge nos discursos de LaRouche e Enéas. Já o Renascimento recupera elementos platônicos, propondo uma visão humanista e cosmopolita da realidade. LaRouche declara-se abertamente platônico, citando Leibniz e Schiller como continuadores dessa tradição. Enéas, por sua vez, mostra influências aristotélicas ao defender a realização do “fim natural” do Brasil por meio da técnica e da soberania. Trump, embora desprovido de estrutura filosófica formal, incorpora elementos mitopoéticos e decisionistas em sua retórica política, ressoando princípios schmittianos e nietzschianos.

3. Lyndon LaRouche: O Platonismo Tecnocrático LaRouche (1922–2019) fundou um movimento internacional com bases no produtivismo, na engenharia estatal e na cooperação multipolar. Sua obra “There Are No Limits to Growth” (1983) critica o modelo maltusiano e propõe uma nova economia baseada em energia nuclear, infraestrutura e soberania econômica. O Schiller Institute, liderado por sua esposa Helga Zepp-LaRouche, segue influente, inclusive no Brasil. Suas críticas à “oligarquia financeira anglo-americana” e aos bancos centrais antecipam temas centrais do populismo do século XXI.

4. Enéas Carneiro: Virtude, Ordem e Soberania Nacional Enéas Carneiro (1938–2007) foi médico, físico e fundador do PRONA. Defensor da energia nuclear, da autodeterminação nacional e do rompimento com o FMI, seu discurso sintetizava elementos da tecnocracia com um moralismo ético-político de inspiração aristotélica. Seu estilo retórico, marcado por frases curtas e intensas, simboliza uma tentativa de refundar o ethos nacional a partir de princípios de ordem e disciplina, numa herança moderna da Escolástica aplicada à política.

5. Donald Trump: Populismo, Protecionismo e Ressurgência Nacional Donald Trump (1946–) ascende em 2016 com uma plataforma centrada no lema “America First”. Sua política tarifária contra a China, iniciada em 2018, marcou uma inflexão no liberalismo econômico dos EUA. Com tarifas que chegaram a 25% sobre produtos chineses, Trump visava proteger a indústria americana e forçar acordos bilaterais. Em 2024, prometeu tarifas de 10% sobre todas as importações e de até 60% sobre produtos chineses. Tal estratégia ecoa os princípios de LaRouche e Enéas, ao defender um Estado forte e soberano frente à ordem global liberal.

6. Desdobramentos e Atualidade As ideias desses três atores reverberam em diversos movimentos soberanistas e tecnonacionalistas. No Brasil, grupos ligados ao pensamento militar e ao conservadorismo ilustram a permanência do ideário de Enéas. Nos EUA, o trumpismo influenciou a reorganização do Partido Republicano e inspirou movimentos em países como Hungria, Itália e Polônia. A crise da ordem global, intensificada por pandemias, guerras e instabilidade econômica, deu novo fôlego às propostas de reconstrução soberana com base em razão técnica e vontade nacional.

7. Conclusão LaRouche, Enéas e Trump representam formas distintas, mas convergentes, de resistência à hegemonia liberal e à financeirização global. Suas ideias se nutrem de tradições filosóficas que, embora antigas, oferecem ainda um arsenal conceitual para pensar a crise da modernidade. A política tarifária de Trump, em especial, é um sintoma claro de um novo ciclo de protecionismo e nacionalismo econômico, herdeiro indireto do pensamento tecnonacionalista de LaRouche e Enéas.

Referências:

  • LaRouche, L. (1983). There Are No Limits to Growth. Executive Intelligence Review.
  • LaRouche, L. (1984). So, You Wish to Learn All About Economics?
  • Zepp-LaRouche, H. (2020). The Coming Eurasian World.
  • King, D. (1989). Lyndon LaRouche and the New American Fascism. Doubleday.
  • TV Câmara. (2016). Enéas – Um Brasileiro Incomum. Documentário.
  • Discursos parlamentares de Enéas Carneiro (2003–2007). Câmara dos Deputados.
  • Snyder, T. (2017). On Tyranny. Tim Duggan Books.
  • The White House (2018). Statement on Section 301 Tariffs on Chinese Imports.
  • Brookings Institution (2023). Trump’s Tariff Legacy and What Comes Next.
  • Deneen, P. (2018). Why Liberalism Failed. Yale University Press.



Vamos aprofundar o conceito de nação no contexto do artigo, conectando-o a LaRouche, Enéas, Trump, e às tradições filosóficas de Platão, Aristóteles, a Escolástica e a Renascença.


🏛️ O CONCEITO DE NAÇÃO: FUNDAMENTAÇÃO FILOSÓFICA E POLÍTICO-HISTÓRICA

🔹 1. Origem e Evolução do Conceito de Nação

  • Na Antiguidade Clássica, os termos mais próximos de “nação” (do latim natio, “nascimento”) se referiam a grupos étnicos ou de origem comum, muitas vezes vistos como estrangeiros (não cidadãos plenos).
  • Em Aristóteles, o conceito de polis era o centro da vida política — a cidade-Estado que, unida pela linguagem, valores e leis, visava o bem comum. Isso já antecipa elementos da ideia moderna de nação.
  • A Idade Média, por meio da Escolástica, subordinava a ideia de povo e autoridade ao plano divino. A ideia de “nação” era pouco relevante frente à unidade do mundo cristão e do Império.
  • No Renascimento e especialmente no Iluminismo, o conceito de nação começa a adquirir caráter político e territorial, levando ao surgimento do Estado-nação moderno.

🔹 2. Nação como Expressão de Finalidade (Telos) – Aristóteles e Enéas

  • Aristóteles, em Política, define o Estado como a união de famílias e aldeias que visa à vida boa. Ele fala da função (ergon) e da finalidade (telos) de cada ser — inclusive da polis.
  • Enéas Carneiro retoma, mesmo que implicitamente, essa visão: o Brasil teria uma missão natural, um destino a cumprir por meio da ciência e do poder nacional. Isso está alinhado à ideia aristotélica de que cada coisa tem um fim natural que deve ser realizado plenamente.

🔹 3. Nação como Corpo Moral e Ideal – Platão e LaRouche

  • Para Platão, especialmente na República, a cidade ideal é uma estrutura harmônica, onde cada classe cumpre seu papel. Essa cidade é governada por filósofos e orientada pelo Bem.
  • LaRouche via a nação como uma entidade moral e educadora, que deveria ser conduzida pela razão científica e pela cultura clássica. Sua ideia de nação é pedagógica e civilizacional, não apenas territorial.
  • Assim como Platão via a degradação das formas de governo (timocracia, oligarquia, democracia corrompida), LaRouche via o liberalismo moderno como degenerado, precisando ser superado por uma república platônica tecnocientífica.

🔹 4. Nação como Mito e Vontade – Trump

  • Donald Trump, diferentemente de LaRouche e Enéas, trabalha a nação como mito identitário: “Make America Great Again” não é um plano técnico, mas uma evocação emocional.
  • Seu uso da nação é baseado no ressentimento e na exclusão: há um “povo verdadeiro” traído por elites globais.
  • Essa noção se aproxima da ideia de Carl Schmitt, onde a política é definida pela dicotomia amigo/inimigo, e a soberania surge da exceção. A nação é aquilo que decide quem pertence e quem ameaça.

🔹 5. Escolástica, Renascença e a Nação

  • A Escolástica subordinava a nação ao plano divino universal. A ideia de pátria estava sempre abaixo da Igreja e do Império.
  • No Renascimento, surge a noção de que o homem pode construir a história — e com isso, a nação passa a ser vista como um projeto humano (Maquiavel, Bodin).
  • Essa mudança de paradigma é a base para o nascimento do nacionalismo moderno, que todos os três — LaRouche, Enéas e Trump — reinterpretam a seu modo.

📊 Comparativo: Três Visões de Nação

ElementoLyndon LaRoucheEnéas CarneiroDonald Trump
Base filosóficaPlatão, Leibniz, SchillerAristóteles, Escolástica, Tomismo técnicoIntuição populista, Schmitt, mídia
Nação como…Corpo moral, educador racionalOrganismo técnico-ético soberanoMito identitário do povo traído
Função do EstadoElevar moral e tecnociência da naçãoRealizar o potencial natural do BrasilProteger a economia e cultura “autêntica”
Inimigos da naçãoFinanceirismo global, imperialismoGlobalismo, submissão ao FMIChina, imigração, globalistas

📚 Referências adicionais sobre o conceito de nação

  • Anderson, Benedict. Comunidades Imaginadas (1983)
  • Smith, Anthony D. Nationalism and Modernism (1998)
  • Aristóteles. Política
  • Platão. A República
  • Carl Schmitt. O Conceito do Político (1932)
  • LaRouche, Lyndon. The Science of Christian Economy
  • Carneiro, Enéas. Discursos no Congresso (2003–2007)
  • Trump Campaign. America First Trade Policy (2018–2024)


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Teoria dos registros de representação semiótica

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Parábola (figura de estilo)

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Fábula

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